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Crítica: Em Nome da América

As férias em outras realidades

Por Fabricio Duque

Durante o Festival do Rio 2017


É quase uma informação recorrente nas críticas daqui do site de que a verdadeira essência de um documentário é sua história escolhida, esta que ganha muito mais força quando traz novos temas (ainda não tão conhecidos). “Em Nome da América” é um desses exemplos. Por uma narrativa investigativa, de jornalismo cadenciado, nós espectadores somos imersos nas vidas desses personagens: americanos que se voluntariaram a fim de estudar específicas questões das terras brasileiras, que “foram e não trouxeram nada do Brasil, só lembranças”.

Dirigido por Fernando Weller (de “Língua Mãe”, junto com Leo Falcão), Professor Adjunto do Departamento de Comunicação da Universidade Federal de Pernambuco, o documentário “Em Nome da América” conduz-se por entrevistas destes “jovens americanos vivendo o Brasil dos anos sessenta” (os voluntários comunitários da paz) e pelos locais do setor de Saúde, fotos pessoais e muitos arquivos históricos (como os filmes da época, por exemplo o carnaval e sua música, samba, arroz e feijão).

E também “fazendeiros: homens simples com ideias simples” (com “arma e anel de quinze k”). Cada um deles explica com riqueza de detalhes e de memórias (estas mais subjetivas) sobre o que faziam e qual era o verdadeiro objetivo do Governo. A narrativa intercala o agora e o antes, com o intuito de mostrar a adaptação deles em um novo ambiente de uma terra estranha, passando pela “Revolução do Veludo”, o “golpe suave”.

Na década de 1960 milhares de esperançosos jovens norte-americanos vieram para o país, mais especificamente para cidades nordestinas, através do programa de voluntariado Corpos da Paz. Atraídos por comerciais de televisão que “vendiam” a pacificação e a “exploração” de novos lugares, espaços e geografias. Era como uma “jornada” antropológica. Um estudo de campo. Um descanso da hostilidade da realidade. Uma “salvação” auto-ajuda de conseguir a máxima como ser-humano, aumentando a “pontuação” no ranking de melhores indivíduos sociais.

É a tão conhecida tipicidade americana de “fazer o bem para acalmar o próprio coração”. Com a missão de ajudar, mas sem funções específicas, incentivo financeiro ou amplo acolhimento da população, eles na verdade eram peças da agressiva política de influência de John F. Kennedy na América do Sul, e através de depoimentos e materiais de arquivo o documentário revela as contradições entre a motivação dos jovens e o que de fato faziam.

“Em Nome da América” é a voz depoente de entrega destes voluntários, protegidos agora pelo retorno a seus países natais. “Os fazendeiros pagavam pistoleiros para matar crianças”, diz um deles, que para a maioria daqui desconfiavam de que estes ianques eram “espiões da Cia no Recife”. Mas uma americana resolveu ficar e aceitou as consequências de dizer toda a verdade. “Os outros falam e vão embora, eu fico aqui para pagar”, diz.

Estes voluntários, “idealistas, pragmáticos, realistas” não foram “colocados por questões políticas”. Eram educados por motivação aos “ignorantes”. E voltaram “amargos da vida” pelas “cinco fases” e “fugidos da guerra”. “Jamaica, Afeganistão, Cuba, tudo sem registro”, diz com o paralelismo da água filtrada do território americano.

É um documentário sobre perder a memória. Sobre a “culpa de ser americana”. Sobre “atender a pobreza” e não à “política”. Sobre sentir saudade, que “fica no ar”, desta nossa terra tão problemática socialmente, mas que encanta e acolhe como ninguém qualquer um que aqui venha.

“Em Nome da América” é um documento de resgate. De reavivar uma parte cruel da história. De não esquecer, a perpetuando nas telas do cinema, para que assim possa servir às novas gerações, estes jovens de agora que se alienam mais e mais em seus mundinhos individualistas, próprios e conectados a uma solitária e digital, que se conflituosa por possuir tanta gente e ao mesmo com a metáfora do sem ninguém.

O filme aborda também uma tensão, quase estrutura de gênero de ação, ao explorar o mistério em torno do suposto espião Tom Hogen, com pistas, indicativos, falsas perspectivas, conversas. É a forma que o diretor encontrou em prender o espectador à cadeira de cinema e desferir tudo que precisa dizer sobre o tema que escolheu. É uma experiência multi linguista que traça com cadenciada qualidade a história, a memória, a causa do passado, a consequência no presente e a visão estrangeira confrontada com uma distante e “estereotipada” em uma orgânica excentricidade da realidade brasileira, com suas dificuldades, falta de água e suas leis do “quem pode mais”. Seleção competitiva de documentário do Festival do Rio 2017.

4 Nota do Crítico 5 1

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