Pastiche de autoria
Por Vitor Velloso
Durante o Festival do Rio 2018
“Cine Holliudy 2: Chibata sideral” é um filme diferente. De uma maneira acentuada, por esse motivo escrever uma crítica sobre ele é um desafio que irei cumprir mais à frente. Muitos adjetivos podem ser dados a ele, quanto a isso, não sei se gostei do longa e não sei se desgostei. Sim, eu disse que era diferente. O fato é, o nível agudo de fanfarronice envolvendo a obra é o segredo de seu carisma. Paródia de todos os subgêneros, centenas de referências à outros filmes, piadas idiotas, tudo isso compõe o tempo de projeção do projeto.
Dirigido por Halder Gomes, a trama uma história absurda e nonsense, criando uma atmosfera chanchadesca que contribui ao clima descerebrado de todo o conjunto. Francisgleydisson é um cinéfilo que após ir a falência decide realizar um longa que irá sanar todas suas dívidas financeiras, o detalhe é que o protagonista viu um amigo seu ser abduzido por alienígenas e decide transformar parte dessa história em narrativa cinematográfica, Lampião x Alienígenas.
Com uma convenção de clichês e desclichês, o diretor busca a falta de originalidade para criar algum grau de autoria. O mais impressionante é a eficácia da estratégia. Com um roteiro que tem tudo pra dar errado e tudo pra dar certo, “Cine Hollyudi 2” chega no festival do rio provocando algumas risadas e tiradas política e outras levemente moralistas, quase como uma necessidade de reforçar seu teor paródico. O regionalismo abraçado pelo cineasta é admirável, as variações são tantas que a legenda se faz necessária, sendo parte da comédia, inclusive. Existe uma tirada envolvendo latim, que é digna de nota.
O humor é escatológico e absurdo, é necessário um investimento com o teor da obra. Esse tipo de engajamento para com a questão cinematográfica de maneira específica, como neste caso, é sempre um ponto chave da discussão, pois, ao mesmo tempo que torna-se a maior arma a favor da película, pode ser sua maior inimiga. No caso, é uma de suas fraquezas, isso porque o ritmo da trama é muito irregular, logo, essas ascensões instigam o espectador a mergulhar na mente de Halder, porém, nas suas quedas, acaba por distanciar o público de maneira agressiva. Apontar o culpado para este efeito é um exercício injusto, pelo fato de enxergar a necessidade de reduzir o público-alvo a fim de possuir um resultado mais expressivo, não em quantidade, mas em qualidade.
As atuações são caricatas, como todas as partes técnicas, já que a intenção é compactuar com o sentimento canastrão geral, o mesmo, mostra-se competente a partir do momento que achamos toda a narrativa e a comicidade sem graça, mas não conseguimos desgostar da atmosfera. Não que seja uma ideia sólida, longe disso, mas é sincera o suficiente para cativar parte da atenção do espectador.
A compreensão da relação entre o roteiro e a direção é feita de uma maneira extremamente orgânica, a traição do papel à tela se dá com uma postura fiel de Halder ao texto. A maneira que o diretor encontrou para realizar esta transição foi escalonar a decupagem de uma forma fragmentada, rimando com as piadas muitas vezes fora de tempo. Não à toa tentar apreciar a fotografia de “Cine Hollyudi” pode ser uma experiência conturbada, não que o trabalho feito seja ruim, porém, a forte presença de uma luz não natural na tela, imprime uma artificialidade que afasta a imersão do espectador. O que pode ser levado como elogio, já que a intertextualidade é um dos fortes da “franquia”.
No fim, a continuação do popular longa de 2013 concretiza-se num antro de referências pops que culminam em uma agradável sessão. É difícil sair sem dar ao menos uma risada, um mérito ao Halder que conseguiu provocar uma paródia de gêneros e obras clássicas numa potência de dinheiro no mercado audiovisual brasileiro, abrindo inúmeras possibilidades estéticas à obra. Em um mundo regado de uma intermídia potente e que atrai o grande público, ter essa representação, ainda que possível, surgindo no cinema é de fundamental importância à indústria. Não ouvi nenhuma declaração do diretor ou algum produtor sobre a ideia, mas fica aí um desejo, um pouco mórbido, devo confessar, de que o projeto vá a frente.