Cordialmente Teus
A certidão de óbito do cinema nacional
Por Giulia Dela Pace
Não vale a pena comentar sobre ou assistir a este filme. “Cordialmente Teus” de Aimar Labaki é uma das piores produções cinematográficas – o uso da palavra aqui é aplicada com muita dor – neste ano de 2022. Sem sombra de dúvidas é uma das muitas certidões de óbito do cinema nacional que desmotivam, desencorajam e entristecem a todos os espectadores.
Primeiramente, é necessário esclarecer sobre o leitor médio. Aquele tio que suga a energia de todos e todas nos domingos em família ao falar sempre sobre coisas como: “o brasil não tem jeito”, “o merdil, o bostil”. É um tipo de “psdbista” infeliz que tenta fazer a vida dos outros um inferno tanto quanto a sua também é – o famoso caso do trabalhador proprietário de celta 2008 que vota em grande latifundiário. Mas a esquerda brasileira também escapa do cargo de leitor médio? Claro que não! Este é o encontro das águas da esquerda cirandeira capenga e murcha com a direita. O leitor médio que falamos aqui é aquele que ama detalhes minuciosos, explicações das mais prolongadas e estúpidas. É o leitor que se satisfaz com o mínimo de noção sobre um assunto ou adora palestrar sobre aquilo que ele não tem conhecimento apropriado. É o intelectual de bar que braveja sua concreta razão e ama o falso sentimento de novidade ou fato simulado como saber revolucionário.
“Cordialmente Teus” é o suco desse evento “médio” e superficialidade estapafúrdia. É um filminho medíocre que tenta soar como o jornal da verdade com as mais revolucionárias e complexas reflexões. E pior, além de chatinho, é datado – como toda falsa boa nova do leitor médio – atrasado se consideramos o momento contemporâneo, repleto de “coisinhas” capengas e interpretações ridiculamente rasas de grandes – realmente grandes – como Raízes do Brasil, de Sérgio Buarque de Holanda, ou Um Novo Tempo do Mundo, do filósofo brasileiro Paulo Arantes.
Mas não para por aí! Como se não bastasse uma proposta e roteiro ruim, “Cordialmente Teus” tem uma atuação podre. No entanto, não basta – ou não deve-se – atribuir culpa apenas aos atores e atrizes do elenco, mas à direção de péssima qualidade. Tão malfeita que nem mesmo se restringe à direção de atores, mas à montagem que não sabe respeitar tempo cronológico numa linha de raciocínio compreensível aos espectadores e não tão somente ao roteirista nem mesmo o tempo de respiro e absorção de cada trecho cronológico que o filme constrói. E tem uma direção de arte tão mixuruca que faz novelas de certas emissoras parecerem documentários históricos de moda.
Assim corre o filme: situações cotidianas de pessoas comuns em um país nitidamente marcado pela violência constante, pela opressão e pela desigualdade social. Uma visão nenhum pouco distante da realidade brasileira desde os tempos mais longínquos que o longa perpassa, mesmo que as dez histórias abordem um recorte da vida de pessoas distintas em tempos diversos. “Cordialmente Teus” ainda trabalha sobre o presente pandêmico onde uma mulher questiona sobre o sistema monetário, a economia capitalista e sistemas bancários, então parte para reações agressivas. Mas é claro, dentro de um roteiro que falta refletir e maturar um tanto mais.
Enfim, há certos pontos interessantes no filme, certas propostas que se amadurecidas e parceladas em médias, ou até curtas, diferentes são potencialmente positivas. Mas infelizmente, tudo foi feito com pouco esmero, pois é visivelmente bagunçado. Até mesmo dentre as, prováveis, referências teóricas e reflexivas do filme, como o renomado Sérgio Buarque de Holanda, jamais cobririam tantos temas em tão pouco tempo e de forma tão atolada de detalhes em espaços pequenos. Não é à toa que Sérgio Buarque de Holanda escreveu inúmeros volumes e em capítulos muito bem alinhados e que seguem uma linha, relativamente, direta de pensamento. Assim, torna-se realmente possível compreender o que se quer explicar e expressar.
Para finalizar, este filme é um vômito de informações, de frustrações, de questionamentos e problemas muito mais que válidos, mas feito da forma mais ruminada possível e sem sal. É a pior uma hora e meia que se pode passar assistindo um filme. É a falência e suco da decadência do cinema nacional, que nunca foi forte e de fato não demonstra qualquer esperança de um dia se concretizar sem nomes excepcionalmente únicos perdidos e esquecidos por aí.