Coisas Úteis e Agradáveis
O tempo e espaço no verbo
Por Vitor Velloso
Durante a Mostra CineBH 2020
O filme oficial da abertura do CineBH, “Coisas Úteis e Agradáveis” de Germano Melo e Ricardo Alves Jr., é uma obra curiosa. Feita em confinamento, o curta-metragem se torna uma discussão versátil da adaptação de “As Cartas de Amabed” de Voltaire e o cristianismo em sua forma mais primitiva.
Aqui, os esforços estão concentrados em tornar direto o discurso do texto original, enquanto uma reimaginação a partir do espectador, onde o espaço e o tempo se dilata em oralidade. Isso torna alguns efeitos interessantes, não necessariamente novos, mas que permanece com o espectador por algum tempo após o fim da exibição. Os deboches somados à esse estoicismo quase classista de formalizar o desejo enquanto única objetividade cinematográfica possível, reforça um tom que vemos ao longo da filmografia de Ricardo Alves Jr., que é a inserção do espaço enquanto debate, sem manter-se distante deste objeto centralizador. Aqui, existe uma materialidade que não se apresenta em imagem, apenas nas falas de seu protagonista. Logo, a dilatação que o filme gera em torno de seu próprio campo “dramático”, se desfaz como quem não possui questões basilares a apresentar além da própria oralidade. É um retorno à narração, enquanto oposição das exposições pragmáticas.
É claro que a forma retém grande parte de um possível orçamento, mas o que este movimento gera, é bastante fértil. Os dois cineastas reúne uma gama de possibilidades plurais e amplamente debatidas no cinema. Mas o fazem sem levantar questionamentos classistas, é o pragmatismo econômico, material, que recorre à teoria, não o contrário. Ricardo traz a íntima relação cinema x teatro, novamente em “Coisas Úteis e Agradáveis”.