Cobertura da 16a Mostra de Cinema de Ouro Preto
CineOP 2021 e o Debate Inaugural: Memórias Entre Diferentes Tempos
Por Vitor Velloso
O debate inaugural que abre frente à todas as temáticas, “Memórias entre diferentes tempos” contou com a participação de Alfredo Manevy – professor e pesquisador | SP, Inês Teixeira – pesquisadora e professora | MG, Laura Bezerra – professora de Política e Gestão da Cultura/UFRB | BA e mediação de Clarisse Alvarenga – curadora da Temática Educação | MG. Algumas provocações prévias, que já haviam sido publicadas no site da CineOP, nortearam a conversa.
“Quais são os pontos de contato e as distinções mais evidentes entre as atividades audiovisuais dos anos 90 e dos últimos cinco anos nos setores da realização, exibição, educação e preservação? De que modo essas encruzilhadas históricas e suas distâncias são mobilizadas pela política de modo mais amplo? Há mudanças significativas em relação a como os anos recentes e os anos 90 operaram na relação entre cinema, educação, preservação e gestão pública no audiovisual?”
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Nesse sentido a fala inicial de Alfredo Manevy faz uma introdução histórica e crítica que busca compreender nossa história de dependência direta e de como o projeto de destruição da cultura, do atual ocupante da cadeira no Palácio do Planalto (com largas estruturas prévias), vem sendo efetivo e criará violentos vácuos que teremos de lidar nos próximos anos. Em uma breve síntese Alfredo foi cirúrgico na realidade cinematográfica nacional: “a combinação da questão da Cinemateca, colocando em risco essa memória, uma instituição que está correndo um risco tremendo, se não houver uma intervenção. Com a desregulamentação do nosso mercado audiovisual… Eu poderia definir que o Brasil entra na economia mundo como consumo de audiovisual e não como produtor de uma cinematografia própria… Basta que nós nos ofereçamos como um mero mercado de consumo”. O professor e pesquisador ainda alerta sobre a necessidade de diferenciar o atual governo dos demais projetos neoliberais que o Brasil viveu: “acho que Bolsonaro representa algo muito mais violento”
A fala do professor e pesquisador abriu margem para que um diagnóstico da cultura nacional pudesse ser realizado através da ótica regional, ou seja, na compreensão totalizante de nossa cultura a partir de uma diversidade de aspectos que foram expostos por Laura Bezerra: “Há mais de 50 anos, Bernardet chamava atenção para ritmos diferenciados, e eu acrescento de condições muito diversas, na produção audiovisual das diferentes regiões do país. E historicamente a produção dos diversos Estados brasileiros, para além dos ciclos, quase sempre fica em uma zona opaca. É por isso que estou propondo pensar nessa produção regional, é refletir um pouco também, como elas podem ser integradas em uma narrativa nacional”.
A fala não poderia estar mais correta, aliás, o que marca essa ideia de uma identidade nacional são, em parte, nossas diferenças regionais e como essa (suposta) digressão tem pouco haver com uma secção de um panorama brasileiro. A frase ”precisamos resistir a lama”, aliado aos argumentos de que a representação atravessada feita a partir de estereótipos é absolutamente problemática, abriu caminho para que a Rosza Filmes pudesse ser citada como um exemplo de reafirmação dessa identidade e de uma produção que caminha na contramão dessa centralização nos debates e fomentos.
Inês Teixeira continuou o debate tratando a memória como esse ponto de uma disputa política em que “Agora, a questão é, tanto quanto esquecimento. É um campo de disputa, em sociedade cingidas por classes sociais, por grupos étnicos culturais, por relações de gênero, regionais e outras mais, essa disputa é absolutamente essencial.”
Na própria seara da “Memória entre diferentes tempos”, Inês ressalta que : “Os ano 90, de uma forma reduzida, instauram definitivamente, por um tempo histórico, por algumas décadas, a disputa entre a concepção de educação como mercadoria, como serviço e mais recentemente como empreendedorismo, variações e desdobramentos das concepções liberais e neoliberais e a ideia da educação como possibilidade emancipatória”. O trato da educação atualmente é visto como uma espécie de “coaching”, onde as políticas neoliberais trabalharam para o distanciamento do pensamento crítico, fomentando a desarticulação cultural e prezando pela hegemonia do processo. Vale lembrar que a base do fascismo é o consenso.
“E os tempos presentes? Eles trazem em si, os tempos outros, como os tempos da escravidão, os tempos da violência, do genocídio indígena. Tempos estes que insistem em ficar a nossa frente, tempos esses que a gente não conseguiu derrotar”
Inês também citou a grande importância da luta de Alicia Vega Durán (que está presente na programação da CineOP, realizando uma aula mestra no dia 25) no Chile e como o exemplo deveria ser encarado no Brasil, incorporando educação e cinema. De maneira oportuna, uma pergunta no chat, formalizada por “Pedro MC” deu continuidade ao assunto, onde o mesmo perguntou “Porque o audiovisual não entra no currículo básico no brasil?” E Adriana Fresquet (que irá participar da conversa com Durán) respondeu que “A proposta de regulamentação da lei 13006/14, dorme numa gaveta desde maio de 2016… numa gaveta do Conselho Nacional da Educação”.
Com belas provocações e críticas ao atual cenário político que o Brasil se encontra, o debate inaugural se encerrou, deixando mais perguntas que respostas. Ao longo da programação diversos temas terão um espaço maior para serem desenvolvidos e com cobertura do Vertentes do Cinema. Continue acompanhando no site a cobertura da 16a CineOP!