Heli
Heli com dois olhares
Por Fabricio Duque
Durante o Festival de Cannes 2013
“Heli”, de Amat Escalante. Exibido no Festival de Cannes 2013, apresenta-se como violento, visceral, usando a brutalidade como mote à crítica social de mostrar o problema para que assim possa solucioná-lo. A coletiva de imprensa basicamente seguiu esta linha. A Cahiers não gostou, Le Monde também não. A Premiere quase forneceu nota máxima (que é o símbolo da Palma de Ouro). Honestamente, o filme torna-se cliché do não cliché em querer chocar com sensacionalismo e exacerbação os sofrimentos de indivíduos minoritários da sociedade.
“Não acho que o filme seja mais Sergio Leone. Eu faço o cinema que eu gosto, que vem naturalmente quando estou fazendo. Drama, extremado. Eu vivo lá, estou protegido. Como crianças de 12 anos tendo crianças. Eu tento mostrar as causas das pessoas e o que elas causam, e que afetam os mais novos no filme. Tentam escapar de algo. Tentam encontrar algo. Pelo sexo e ou violência. Procura-se a esperança, durante o filme. Tivemos o objetivo de mostrar a violência que choca. As pessoas do meio. Mostrar que o miserável é muito ruim. Sem água, sem luz. Sinto muito confortável de fazer o filme desta forma, e não estou tentando me justificar, mas o povo de fora tem dificuldades de entender”, disse o diretor Amat. Gabriel Reys completa “É uma violência do que acontece hoje. Nós temos que falar das coisas ruins. Dos problemas do mundo. Quando falamos sobre algo é saudável. Nos mostramos para expôr, senão estaríamos nos escondendo. Moralmente, mostrar como a violência é, sem suavizar ou mascarar”.
Complemento por Francisco Carbone. “Heli” de Amat Escalante abriu a competição do Festival de Cannes, além de abrir também a “porteira” para a minha seleção particular do Festival do Rio desse ano. Engraçado como na Riviera o filme chegou fazendo polêmica mas acabou esquecido, para renascer na noite da premiação com um inesperado prêmio de direção para o jovem mexicano; aqui no Rio o filme chegou com essa pecha negativa, o de vencedor injustiçado. Talvez nunca vejamos o filme com outros olhos, mas o fato é que hoje temos em mãos um filme que jamais mereceu o louro que Cannes lhe ofereceu. Uma pena, pois o filme é um bom projeto, digno, e até bem dirigido. Mas mesmo tendo visto apenas um outro filme da competição, já sei o quão injusta foi a honraria.
Enfim, o filme. Escalante é jovem, quer mostrar serviço e mostra. Com os poucos recursos que dispõe, dribla as dificuldades da produção com inventividade cênica e soluções criativas, excelente posicionamento e cenas bem decupadas. Mas a verdade é que o roteiro não recebe o mesmo cuidado que a ‘mise-en-scène’, e até essa vai carecendo do apuro inicial e se repetindo, perdendo o frescor. O elenco não ajuda, ninguém está necessariamente bem a frente das câmeras… lá pelas tantas, é fácil desistir.
Na tela, a história da menininha que tem um caso com um rapaz mais velho, do seu irmão com que tem um bebê e uma esposa também jovem, e de como todas essas pessoas são arrastadas para um espiral de violência aparentemente normal nas ruas mexicanas graças a um pacote de cocaína (violência que começa espantando e termina aborrecendo; quase sempre protocolar e perigosamente sem vergonha, no limite da forçação de barra) não impressiona pra gente, povo brasileiro. E aos poucos, a direção inspirada se mostra incapaz de segurar “Heli” que parece mais interessado em impactar de qualquer forma, esquecendo o básico do cinema.