BlackBerry
Obrigado Iphone!
Por Fabricio Duque
Durante o Festival de Berlim 2023
A abertura da Competição Oficial do Festival de Berlim 2023 aconteceu com o longa-metragem “BlackBerry”, uma adaptação do livro “Losing the Signal: The Untold Story Behind The Extraordinary Rise And Spectacular Fall of Blackberry” (“Perdendo o Sinal: A História Não Contada atrás da Extraordinária Subida e Espetacular Queda do Blackberry”), escrito por Jacquie McNish e Sean Silcoff. O primeiro filme concorrente ao Urso de Ouro conduz sua narrativa pelo mesmo padrões do cinema de Hollywood, mesmo tendo na direção o realizador canadense Matt Johnson, que também integra o elenco principal. Isso pode ser comprovado visto que a Paramount Global adorou e já comprou o filme, que será lançado na primavera, entrando na lista de grandes estreias do ano.
Mas por que “BlackBerry” chamou tanta atenção? Pela excessiva ação tensionada de sua narrativa à moda de “A Rede Social” (ou de algum filme que precisa resolver alguma tragédia em dois segundos, na verdade aqui são cinco minutos), pela novíssima montagem à moda do seriado “Sucession” (com cortes picotados, de câmera na mão, soando como um pseudo documentário), pelo nostálgico resgate dos anos noventa a 2000 (como a Noite de Cinema, que referencia “Star Wars”, “Os Goonies”, “Indiana Jones”, “O Clube dos Cinco”) e/ou pelo provocativo protesto em relação a rixa entre Canadá e Estados Unidos (que no fundo “puxa sardinha” ao modelo norte-americano)? Nada ou um pouco de tudo? Aqui, temos, de um lado, a inovação da tecnologia com o Smart Phone BlackBerry. Do outro, o “futuro” que vivemos hoje, o Iphone.
Mas se nós analisarmos de forma mais aprofundada, perceberemos que “BlackBerry” camufla-se em afoitos e estabanados gatilhos comuns, reverberando a mesma fórmula que não causa surpresas no público e “agrada” a da audiência. Na história, que soa como um teatro filmado (parecendo àqueles que é tão 4K que captamos o momento da encenação), há a eterna briga de Davi e Golias. De empresas menores buscando uma ideia inovadora (inicialmente sonhadora) para conseguir a tão desejada fatia de mercado e consequentemente atingir o sucesso. E há também a “expertise” versus ingênuos de plantão. Ainda que a fotografia saturada, às vezes atravessada por vidros para criar a fusão real de dois momentos acontecendo no mesmo instante, ainda que a abertura do filme seja um resumão das mudanças tecnológicas do mundo, ainda que tenha trilha-sonora de Joy Division (“Love Will Tear Us Apart”) e The Strokes (“Someday”), ainda que esses pormenores venham para diminuir as fragilidades e clichês, o filme mantém o forte querer de ser um “pirata”, “roubando” ideias já prontas. Usar referências demais não é um problema. Nunca foi. Mas é necessário construir o terreno antes. Não só jogar e “entulhar” sem curadoria, porque senão tudo se torna lixo descartável com o resultado de encontro casual, que não fica na mente porque não é importante.
“BlackBerry”, ao usar todas essas referências (incluindo imagens de arquivo da apresentação do Iphone em São Francisco), acorda nossos gigantes. Começamos então a querer um novo “A Rede Social”, só que não teremos, porque a “pegada é outra”. Aqui, a guerra tecnológica almeja os estereótipos de Wall Street, dos comportamento de quem obedece e quem manda e do resgate da memória afetiva dos amigos, “a família que escolhemos”. Talvez a definição mais cirúrgica sobre “BlackBerry” é a de que o filme já nasceu datado. Completamente fora do seu tempo. Não por abordar um acontecimento marcante do passado (o sucesso e a queda de um dos aparelhos mais “revolucionários” da História, por brilhantes mentes em Waterloo, no Canadá), mas por se aprisionar nesse detalhe. Se a obra sobre o Facebook norteia o antes com a estética do agora, este prefere não pensar que todo e qualquer objetivo de todo e qualquer filme é ser referenciado e não lembrado como aquele que apenas referenciou. É nítido a urgência de seu realizador com 37 anos, que parece não ter “finalizado” a aparência de seus atores, como o cabelo grisalho de um deles. Concluindo, “BlackBerry” soa amador. Soa impulsivo. Soa preguiçoso.