Mostra de Cinema de Tiradentes 2022
Bate-Papo com os Curadores
Por Vitor Velloso
Como de costume, a Universo Produção promove o debate da curadoria pouco antes do início da programação oficial de suas Mostras começarem. Na 25ª Mostra de Tiradentes, o debate que procura esclarecer a relação da curadoria com o próprio eixo temático, aconteceu com a presença de Camila Vieira – curadora | CE, Felipe André Silva – curador | PE, Tatiana Carvalho Costa – curadora | MG, Lila Foster – curadora | DF, Francis Vogner dos Reis – coordenador curatorial | SP e mediação de Marcelo Miranda – jornalista e crítico de cinema | MG.
Em sua fala inicial, Francis Vogner ressaltou a importância de enxergamos que o cinema sempre esteve em transição, mas ressalta a velocidade dessas transições ao longo de sua história.
“Nos períodos de crise aguda são os períodos que esta transição é mais drástica. Isto está relacionado aos próprios arranjos que o próprio capitalismo produz e tenta renovar seus paradigmas de produção ou simbólicos. Se a gente leva em consideração que a atividade cinematográfica, entre recuos e novos arranjos passa por mudanças intensas nos últimos tempos, isso se deve claramente ao contexto brasileiro, mas também internacional, e as mudanças de paradigma da indústria e do mercado. Que são mudanças que ocorrem em três dimensões: econômica, estética e técnica.” (Para ler as definições dadas pelos curadores leia AQUI!)
A fala de Francis situou parte da Temática da presente edição: Cinema em Transição.
“A gente se depara com algo que não é novo, mas hoje é latente. Uma atividade técnica e estética que não é específica, que não é apartada de um amplo contexto artístico e político. Nós vemos gente de teatro, usando o audiovisual não só como registro mas como algo criativo.”
Lila Foster complementou as falas de Francis e ressaltou que o trabalho da curadoria vai além de escolher os filmes a serem exibidos na mostra.
“Claro que tem as seleções dos filmes, mas também o trabalho dos textos e do catálogo. Agregar e revisitar os filmes do Adirley, há os textos, haverá o debate e a entrevista presente no catálogo. Uma reflexão sobre os processos de trabalho do Adirley, ali tem um mergulho muito profundo, essa trajetória nessa última década e de uma abertura muito grande para a liberdade de experimentação para cada processo.”
Assim, os curadores explicaram mais detalhadamente sobre a escolha do homenageado da 25ª edição e ressaltaram que a própria temática da “Transição”, acaba se confundindo com a trajetória do cineasta, que cruza parte das percepções do cinema brasileiro dos últimos anos.
Camila Vieira cria uma ligação entre a temática e o processo curatorial envolvido. Explicando que existe uma carga a ser trabalhada, não é apenas uma formulação imediata, ou tentativa de resposta ao contexto das produções.
“É importante lembrar que a temática é sempre fruto de um acúmulo de percepções sobre o cinema brasileiro contemporâneo e de algum modo tem conexões sistemáticas das edições anteriores e os desdobramentos que surgem ao longo dos anos. O pensamento da temática acontece em paralelo aos filmes inscritos.”
Além disso, ressaltou que a partir de uma pesquisa dos filmes inscritos, foi possível mapear algumas “tendências” na produção cinematográfica brasileira e compreender como o cinema procura respostas para o contexto político e econômico brasileiro, provocando e criando, a partir de estéticas distintas que procuram ressaltar a materialidade da cultura.
“Um dos mapeamentos que foi possível desenhar, tem haver com filmes, e boa parte desses filmes são documentários, sobre mestres da cultura ou sobre saberes que envolvem comunidades e seus vínculos territoriais.”
Tatiana inicia sua fala sobre a frase uma de Adirley Queiros “O Cinema é para deseducar” e explica o contexto em que o cineasta falou: “O contexto é o Adirley comentando e falando sobre as grandes narrativas que estão muito padronizadas na sociedade. Certos parâmetros e lógicas de mundo que são reiteradas pelo cinema e por outros lugares de organização simbólica e o cinema dele, pela defesa que ele faz que o cinema é deseducação, é para mostrar outras possibilidades de vida.”
Além disso, Tatiana traz números importantes para o público compreender o progresso que ocorreu desde que a Mostra de Tiradentes, em 2019: “quando Tiradentes começa a pedir a auto declaração de raça e gênero”
Agora, em 2022, “nós temos o maior número de pessoas negras na direção, são 30 pessoas. Um número muito maior de mulheres, realizadoras, mulheres cis, trans e travestis, são 36. E três pessoas indígenas assinando a direção.”
Na reta final do debate, Francis explica que “a retrospectiva é uma tentativa de investigar um pouco o lastro que nos trouxe até aqui. A ideia da retrospectiva, dessa Mostra de 25 anos, não é criar novos cânones, é entender alguns filmes que trazem alguns elementos para a gente entender onde chegamos.”
Assim, a temática “Cinema em Transição”, procura não apenas investigar as mudanças ocorridas no cinema nos últimos anos, mas também como o contexto político e econômico passa a afetar diretamente a criação, em seu momento específico e como isso reverbera ao longo dos anos, especialmente agora em um período pandêmico.
A 25ª Mostra de Cinema de Tiradentes possui programação totalmente online e gratuita do dia 21/01 ao dia 29/01 e a cobertura do Vertentes do Cinema acontecerá diariamente.