Balanço, Percepções e Vencedores do Festival de Berlim 2022
Uma edição que aconteceu por protocolo e premiou “Alcarràs”, de Carla Simón, enquanto “Fogaréu”, de Flávia Neves arrematou o terceiro lugar na escolha do público
Por Fabricio Duque
Desde 2014 o Vertentes do Cinema realiza a cobertura presencial do Festival de Berlim, um ano após nosso site ter se aventurado na terra de Cannes. De lá para cá, a Berlinale tornou-se evento obrigatório (sempre fazendo parte de nossa agenda de festivais), muito por causa da cinefilia latente que corre nas veias quentes por ruas geladas, literalmente, visto que o Festival de Berlim acontece em fevereiro, no meio do inverno europeu. Lembro-me como se fosse hoje, assistindo, em uma sala mais que lotada, o primeiro filme em terras berlinenses, “O Grande Hotel Budapeste”, de Wes Anderson, com apresentação da própria equipe da obra. Contudo, Berlim não foi “amor à primeira vista”. Pelo contrário, naquele ano, minha vida mudou por completo, incluindo um término de relacionamento, que eu por medo deixei partir. Enfim, agora são águas passadas, mas naquele tempo aquelas ruas dividiram minhas percepções. De um lado, a solidão. Do outro, acostumar-se com o novo ambiente e suas particularidades históricas. Berlim vive intensidade e um amor genuíno pelo cinema. E muita metáfora também. Por exemplo, 2014 foi o ano de “Praia do Futuro”, de Karim Aïnouz (diretor que por sinal integra o júri da mostra competitiva oficial da 72a edição). Foi o ano de “Boyhood – Da Infância à Juventude”, de Richard Linklater. Foi o ano de “O Homem das Multidões”, de Cao Guimarães e Marcelo Gomes. Foi o ano de “Hoje eu quero Voltar Sozinho”, de Daniel Ribeiro. Foi o ano que conheci muros, histórias e passados.
O Festival de Berlim é muito mais que uma mostra de filmes. Apresenta-se como uma sensação. Em 2020, o festival representou um divisor de águas. Logo em seguida, a pandemia do Coronavírus explodiu no mundo e aterrorizou a humanidade. Assim, eu saí de uma sessão de lá para uma quarentena que levou quase dois anos. No final de 2021, uma esperança de “normalidade”. Vacinas prontas e taxa de mortes em declínio. Tanto que me aventurei em dezembro, no Natal, pelas ruas de Nova Iorque. E no mesmo mês já organizei a “volta” a Berlim para encerrar o ciclo do caos com muito cinema na veia. Mas parece que o Universo gosta mesmo de trolar seus habitantes, igualzinho àquele episódio de “South Park” que mostra que a Terra é um reality show Big Brother de extraterrestres ávidos por desgraças e tretas. Então, uma nova variante apareceu para “movimentar a casa”. Ômicron, seu nome, gerou novo caos. Voos cancelados, festas natalinas em aeroportos, países fecharam suas portas e festivais europeus conservaram o formato online, como foi o caso de Roterdã; e dos Estados Unidos, Sundance.
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Só que o Festival de Berlim manteve em 2022 sua edição presencial. Sim, mas com muitas mudanças. Uma delas foi a redução da duração para as sessões de imprensa, de 11 para 5 dias, de 10 a 16 de fevereiro, anteriormente até o dia 20 de fevereiro. E com capacidade reduzida a 50% nas salas de cinema. Sem festas ou recepções. E com 4 dias, anúncios de vencedores já pululavam. Pois é, foi aí que o Vertentes do Cinema tomou a decisão de cancelar a ida, que gerou em mim dias amuados, porque o “bichinho diabinho” cantava em minha orelha que estava tudo bem. Conversei muito com meu amigo João. Depois fiquei sabendo que Pedro Butcher também não “pagou pra ver”. E assim, o Berlim aconteceu, sem a presença de nosso site, ainda que devidamente credenciado como imprensa internacional (do Brasil). Amarelamos? Nunca saberemos a resposta.
A impressão que tenho é a de que o festival só aconteceu para “cumprir um protocolo” com seus patrocinadores. Cannes também fez a mesma coisa com “medo da multa”. E aí eu me pergunto: como cobrir sem o material bruto na mão? Sim, este texto é um dos mais difíceis, porque preciso contar o que aconteceu em Berlim sem estar em Berlim. E não só por isso. O Festival de Berlim também atravessou o Festival de Roterdã, iniciando seus trabalhos durante os últimos dias da mostra holandesa.
Com seis filmes brasileiros na seleção, nosso país marcou presença. Os filmes brasileiros ficaram de fora da seleção principal, mas estão em mostras paralelas. Na Mostra Panorama, “Fogaréu”, da Flávia Neves. Na Mostra Forum, “Mato Seco em Chamas”, coprodução entre Brasil e Portugal, de Adirley Queirós e Joana Pimenta, e “Três Tigres Tristes”, de Gustavo Vinagre. Na Mostra Forum Expanded, “O Dente do Dragão”, de Rafael Castanheira Parrode. E os curtas-metragens: “Se Hace Camino al Andar”, de Paula Gaitán, e “Manhã de Domingo”, de Bruno Ribeiro.
A atriz Isabelle Huppert foi premiada com o Urso de Ouro Honorário pelo conjunto da obra em 15 de fevereiro de 2022 na cerimônia de premiação no Berlinale Palast, com a exibição de seu filme “À propos de Joan”, de Laurent Larivière.
O JÚRI DA MOSTRA COMPETITIVA DO FESTIVAL DE BERLIM 2022
O Júri da mostra competitiva oficial pelo Urso de Ouro, formado por M. Night Shyamalan , diretor, roteirista e produtor (EUA) – Presidente do Júri; Karim Aïnouz , diretor, roteirista e artista visual (Brasil); Saïd Ben Saïd , produtor (França / Tunísia); Anne Zohra Berrached, diretora de cinema e roteirista (Alemanha); Tsitsi Dangarembga, romancista, dramaturgo e cineasta (Zimbabwe); Ryusuke Hamaguchi, diretor e roteirista (Japão); e Connie Nielsen, atriz (Dinamarca), teve que escolher entre 18 filmes:
“AEIOU: A Quick Alphabet of Love”, de Nicolette Krebitz – Alemanha/França
“Alcarràs”, de Carla Simon – Espanha/Itália
“Both Sides of the Blade”, de Claire Denis – França
“Call Jane”, de Phyllis Nagy – EUA
“A Piece of Sky”, de Michael Koch – Suíça / Alemanha
“That Kind of Summer”, de Denis Côté – Canadá
“Everything Will Be Ok”, de Rithy Panh – França/Camboja
“Leonora Addio”, de Paolo Taviani – Itália
“The Line”, de Ursula Meier – Suíça/França/Bélgica
“Before, Now & Then”, de Kamila Andini – Indonésia
“The Passengers of the Night”, de Mikhaël Hers – França
“Rimini”, de Ulrich Seidl – Áustria/França/Alemanha
“Rabiye Kurnaz vs George W. Bush”, de Andreas Dresen – Alemanha/França
“Robe of Gems”, de Natalia Lopez Gallardo – México/Argentina/EUA
“The Novelist’s Film”, de Hong Sangsoo – Coreia do Sul
“One Year, One Night”, de Isaki Lacuesta – Espanha/França
“Return to Dust”, de Li Ruijun – República Popular da China
“Peter von Kant”, de François Ozon – França
OS VENCEDORES DO FESTIVAL DE CINEMA DE BERLIM 2022
Urso de Ouro
“Alcarràs”, de Carla Simón
Urso de Prata do Grande Prêmio do Júri
“The Novelist’s Film”, de Hong Sang-soo
Urso de Prata do Prêmio do Júri
“Robe of Gems”, de Natalia López Gallardo
Urso de Prata de Melhor Diretor
Claire Denis, por “Both Sides of the Blade”
Urso de Prata de Melhor Performance
Meltem Kaptan, por “Rabiye Kurnaz vs. George W. Bush”
Urso de Prata de Melhor Performance Coadjuvante
Laura Basuki, por “Before, Now & Then”
Urso de Prata de Melhor Roteiro
Laila Stieler, por “Rabiye Kurnaz vs. George W. Bush”
Urso de Prata de Melhor Contribuição Artística
Rithy Panh e Sarit Mang, por “Everything Will Be Ok”
Menção Especial
“A Piece of Sky”, de Michael Koch
Urso de Ouro de Melhor Curta-Metragem
“Trap”, de Anastasia Veber
Urso de Prata Prêmio do Júri de Melhor Curta-Metragem
“Manhã de Domingo”, de Bruno Ribiero
Curta-metragem candidato ao European Film Awards
“The Sower of Stars”, de Lois Patiño
Menção Especial
“Bird in the Peninsula”, de Atsushi Wada
O JÚRI DA MOSTRA ENCONTROS DO FESTIVAL DE BERLIM 2022
O júri do Encounters Awards foi formado por Chiara Marañón, Ben Rivers e Silvan Zürcher. Os filmes:
“A Little Love Package”, de Gastón Solnicki – Áustria / Argentina
“See You Friday, Robinson”, de Mitra Farahani – França/Suíça/Irã/Líbano
“Axiom”, de Jöns Jönsson – Alemanha
“Brother in Every Inch”, de Alexander Zolotukhin – Federação Russa
“Coma”, de Bertrand Bonello – França
“Father’s Day”, de Kivu Ruhorahoza – Ruanda
“Flux Gourmet”, de Peter Strickland – Reino Unido/EUA/Hungria
“The City and the City”, de Christos Passalis, Syllas Tzoumerkas – Grécia
“American Journal”, de Arnaud des Pallières – França
“Small, Slow but Steady”, de Shô Miyake – Japão/França
“Mutzenbacher”, de Ruth Beckermann – Áustria
“Queens of the Qing Dynasty”, de Ashley McKenzie – Canadá
“Sonne”, de Kurdwin Ayub – Áustria
“Unrest”, de Cyril Schäublin – Suíça
“The Death of my Mother”, de Jessica Krummacher – Alemanha
OS VENCEDORES DA MOSTRA ENCONTROS DO FESTIVAL DE BERLIM 2022
Melhor Filme
“Mutzenbacher”, de Ruth Beckermann
Melhor Diretor
Cyril Schäublin por “Unrest”
Prêmio Especial do Júri
“See You Friday, Robinson”, de Mitra Farahani
PRÊMIOS DO PÚBLICO DA MOSTRA PANORAMA DO FESTIVAL DE BERLIM 2022
Vencedor do Panorama Audience Award – Ficção Longa-metragem 2022
1º Lugar: “Baqyt (Felicidade)”, de Askar Uzabayev
2º Lugar: “Klondike”, de Maryna Er Gorbach
3º Lugar: “Fogaréu”, de Flávia Neves
Vencedor do Panorama Audience Award – Panorama Documentário Longa-metragem 2022
1º Lugar: “Aşk, Mark ve Ölüm (Amor, Marcos Alemães e Morte)”, de Cem Kaya
2º Lugar: “Nel mio nome (Into My Name)”, de Nicolò Bassetti
3º Lugar: “Diários de Mianmar”, de The Myanmar Film Collective
OS VENCEDORES DA MOSTRA GERAÇÃO – PRÊMIO DO JÚRI JOVEM
Urso de Cristal de Melhor Filme
“Alis”, de Clare Weiskopf
Menção Especial
“Stay Awake”, de Jamie Sisley
Urso de Cristal de Melhor Curta-Metragem
“Born in Damascus”, de Laura Wadha
Menção Especial
“Nothing to See Here”, de Nicolas Bouchez
OS VENCEDORES DA MOSTRA GERAÇÃO 14PLUS
Grande Prêmio
“Kind Hearts”, de Olivia Rochette
Ex aequo et bono
“Scheme”, de Farkhat Sharipov
Prêmio Especial de Melhor Curta-Metragem
“Goodbye Jérôme!”, de Adam Sillard, Gabrielle Selnet, Chloé Farr
Menções Especiais
“Blue Noise“, de Simon Maria Kubiena e
“Tinashé”, de Tig Terera
OS VENCEDORES DA MOSTRA GERAÇÃO KPLUS
PRÊMIO DO JÚRI INFANTIL
Urso de Cristal de Melhor Filme
“Comedy Queen”, de Sanna Lenken
Menção Especial
“The Quiet Girl”, de Colm Bairéad
Urso de Cristal de Melhor Curta-Metragem
“Spotless“, de Emma Branderhorst e
“Luce and the Rock”, de Britt Raes
PRÊMIO PELO JÚRI INTERNACIONAL
Grande Prêmio de Melhor Filme
“The Quiet Girl”, de Colm Bairéad
Menção Especial
“Shabu”, de Shamira Raphaëla
Prêmio Especial de Melhor Curta-Metragem
“Gavazn”, de Hadi Babaeifar
Menção Especial
“To Vancouver”, de Artemis Anastasiadou
PRÊMIO FIPRESCI
Prêmio do Críticos Internacionais (Lamia Fathy, Ron Fogel, Berke Göl, Bettina Hirsch, Pamela Jahn, Anders E. Larsson, René Marx, Anna Maria Pasetti, Hamed Soleimanzadeh, Andrei Vasilenko, Hsin Wang, Alexander Zwart)
“Leonora Addio”, de Paolo Taviani
OUTROS PRÊMIOS
GWFF Prêmio Melhor Primeiro Filme
“Sonne”, de Kurdwin Ayub
Prêmio de Melhor Documentário da Berlinale 2022
“Myanmar Diaries”, de The Myanmar Film Collective
Menção Especial
“No U-Turn“, de Ike Nnaebue