Ficha Técnica
Direção: Pierre Salvadori
Roteiro: Benoît Graffin, Pierre Salvadori
Elenco: Audrey Tautou, Nathalie Baye, Sami Bouajila, Stéphanie Lagarde, Judith Chemla
Fotografia: Gilles Henry
Música: Philippe Eidel
Figurino: Virginie Montel
Edição: Isabelle Devinck
Produção: Philippe Martin
Distribuidora: Vinny Filmes
Duração: 104 minutos
País: França
Ano: 2010
COTAÇÃO: BOM
A opinião
“Uma Doce Mentira” é o novo filme da atriz francesa Audrey Tautou, queridinha do meio alternativo de cinema por seguir uma carreira promissora, escolhendo papéis que exigem muito de sua própria interpretação. Isso proporcionou reconhecimento internacional, iniciado por “Instituto de Beleza Vênus”, em 1999, chegando ao sucesso arrebatador com “O fabuloso destino de Amélie Poulain”, de 2001, que apresenta um roteiro que manipula, de forma inteligente e perspicaz, o espectador. Após fez “Bem-me-quer, mal-me-quer”, um thriller também manipulador. Seguiu com “Albergue Espanhol” e a continuação “Bonecas Russas”, filme que virou cult não só para os cinéfilos de plantão, mas sim unanimidade do público em geral.
Nesse meio tempo, filmou “Coisas belas e sujas”, sobre tráfico de órgãos, do diretor Stephen Frears. Desse ponto em diante, a sua cinematografia começou a degringolar. Audrey fez “Código Da Vinci”, para que pudesse abocanhar o público norte-americano, mas não deu certo; “Coco antes do Chanel”, vivendo a estilista Coco Chanel; e corroborando o deslize em “Hors de Prix” e no seu mais recente filme em questão. Estes dois são dirigidos pelo diretor Pierre Salvadori, que nasceu na Tunísia, mas é considerado corso francês. Sua característica marcante é trabalhar com comédias românticas, assim tenta mascarar uma experimentação narrativa dentro da obviedade deste gênero.
Mas por mais que ele se esforce, ainda desperta melodramas, ora resolvendo reviravoltas de forma rápida e condescendentes, ora insistindo em um mesmo momento já repetido. O longa-metragem deseja a atmosfera da estranheza e do absurdo realista. Uma ação, que propositalmente (ao roteiro), por um erro não pensado do personagem, direciona-se a outro caminho, gerando situações surreais. Todo esse preâmbulo serve para que eu possa avisá-los de que aquela atriz fantástica está caricata, afetada em seus gestos (infantis). Assim, a definição permitida ao filme é a de pastelão (desencontrada, exagerada, estapafúrdia). Numa manhã de primavera, Emilie, uma sócia em um salão de cabeleireiro (Audrey Tautou), recebe uma linda carta de amor anônima. Sua primeira reação é jogá-la no lixo.
Mas ela vislumbra uma forma de salvar sua mãe (Nathalie Baye), uma mulher triste e isolada desde a partida de seu marido. Sem pensar muito, ela envia a carta para a mãe, sem saber que o autor é Jean (Sami Bouajila, de “As Testemunhas”, “Indigenes” e “Fora da Lei”), seu tímido empregado. Emilie não imagina que seu gesto desencadeará uma série de desentendimentos, criando situações fora de controle.
A sinopse transpassa ao espectador um argumento interessante. O que o torna clichê é a repetição de se querer fazer graça com o absurdo (o tornando crível aos olhos de quem assiste). Em contrapartida, há elementos extremamente favoráveis. Uma delas é a parte técnica, que experimenta ângulos de câmeras e cores que interconectam com a narração (incluindo alguns diálogos e o texto da carta).
O que se lê e o que se escuta, esquecendo a maioria dos diálogos, humaniza a palavra, que por conseqüência também humaniza a ação. Emilie é definida por um tipo. É impaciente, decidida, intransigente, que não consegue o tempo da mãe nem por cinco minutos, que é ameaçada – e inibida – pelo conhecimento cultural de seu empregado (que fala coreano, japonês e italiano), impositiva, ansiosa, prática, extremamente crítica, julgadora e cruel no que diz. “Por que quer sempre mais? Se já tem uma carta, para que outra? A impossibilidade de Emilie expor seus sentimentos (sempre no estado defensivo) é explicitamente observada quando tenta escrever as cartas, que ficam sem emoção, sem paixão e sem inspiração. “Uma carta frígida”, diz-se arrancando gargalhadas da plateia.
As ações e reações buscam a cumplicidade do espectador, mas não oferecerem a contrapartida do convencimento narrativo. “Eu posso mudar o outro”, diz com prepotência. “Você é tão perfeita”, rebate-se com sarcasmo, dita pela mãe, que é vivida pela atriz Nathalie Baye (que já trabalhou em vários filmes de François Truffaut, Godard, Pierre Granier-Deferre, Steven Spielberg – “Prenda-me se for capaz”, Claude Chabrol e Tsai Ming-liang, entre muitos outros) está fantástica, somando pontos positivos ao longa-metragem, com a figura da mulher passional, que atravessa uma crise de separação matrimonial.
Ela mescla resignação, tristeza, aceitação, desespero, perseguição ao “anônimo” que talvez tenha escrito a carta, vivacidade, elegância, entregando-se, plenamente, ao seu papel. “Ele é vinte anos mais novo, é claro que vou sofrer”, diz, realista. A solução requerida à resolução dos desencontros é um lençol que divide a mãe e a filha conversando. Sombras são vistas de um lado e a realidade do outro. Experimenta com competência. “Como você pode inspirar tanta mediocridade”, diz-se.
O roteiro perde-se com a mudança de ritmo, porque insere elementos demais à trama. “A raiva me devolveu a vida. “E a vida continua”, finaliza-se. Concluindo, um filme com altos e baixos, apresentando ritmos diferenciados, não acertando, na maioria do tempo, no tom narrativo, ora exagerado demais, ora aprofundado (com clichês latentes). Um bom filme, nada mais. Recomendo. Exibido no Festival Varilux de Cinema Francês 2011.
O Diretor
PIERRE SALVADORI após estudar teatro com Jacqueline Chabrier e trabalhar no café-teatro, ele redige seu primeiro roteiro de filme em 1989, que, quatro anos depois, estreará como “Cible émouvante”. Em 1995, ele dirige “Les Apprentis”, uma comédia sobre as desventuras de dois amigos meio fracassados, e “Comme elle respire”, que reúne seus atores preferidos: Guillaume Depardieu e Marie Trintignant. Fascinado por Lubitsch, Pierre Salvadori assinou 3 comedias deliciosas, alegres, elegantes e dotadas de um sentido do ritmo rigoroso : “Après vous” com a dupla José Garcia e Daniel Auteuil (2003), “Amar não tem preço” com Audrey Tautou e Gad Elmaleh (2006) e agora “Uma doce mentira”.