Ficha Técnica
Direção: Sebastián Borensztein
Roteiro: Sebastián Borensztein
Elenco: Ricardo Darín, Muriel Santa Ana, Javier Pinto, Ignacio Huang
Fotografia: Rolo Pulpeiro
Música: Lucio Godoy
Direção de arte: Laura Musso
Figurino: Cristina Menella
Edição: Pablo Barbieri Carrera e Fernando Pardo
Produção: Pablo Bossi, Juan Pablo Buscarini, Gerardo Herrero, Axel Kuschevatzky, Ben Odell
Distribuidora: Paris Filmes
Duração: 93 minutos
País: Argentina/ Espanha
Ano: 2011
COTAÇÃO: ENTRE O BOM E O MUITO BOM
A opinião
“Um Conto Chinês”, baseado em fatos reais, conta a história de um homem recluso em sua casa, que por acontecimentos passados, que serão explicados ao longo da trama, não consegue manter um relacionamento interpessoal, o definindo como impaciente, e agressivo em muitos momentos, dizendo sempre a verdade. Roberto, interpretado por Ricardo Darín, um ícone do novo cinema argentino (de “O Segredo dos Seus Olhos”, “Filho da Noiva”, “Nove Rainhas”, entre muitos outros), é metódico e sistemático em suas ações cotidianas. Realiza sempre tudo do mesmo jeito, impossibilitando a vontade de mudança, que pode ser entendida por comodismo sentimental e medo defensivo. O diretor Sebastián Borensztein (de “A Sorte Será Lançada”, “Sem Memória”), filho do famoso comediante argentino Tato Bores, apresenta o seu terceiro longa-metragem, também assinando o roteiro, que imprime um tom de humanização ao protagonista, quando o define, respeitando as suas manias e idiossincrasias.
É comum a este cinema a característica de não julgamento, apenas de retratar o ser humano como realmente é. O ator principal, curiosamente, desde o início de sua carreira, escolhe (ou é escolhido) papéis independentes – e autorais (que intensificam a interpretação), com roteiros que manipulam o espectador (positivamente) e filmes com alta experimentação técnica (como é o caso de “O Segredo dos Seus Olhos” e sua cena incrível do estádio). Este último é visível logo no começo deste filme em questão, quando a câmera vira de baixo para cima, pondo em prática uma interação estética.
Porém é um dos únicos momentos em que isso aparece de forma explícita, complementada pela sequencia que atravessa o vidro da porta. Nos outros, há aproximação sutil da câmera, dentro de um universo que conta histórias absurdas, que são lidas por Roberto. O roteiro ao realizar a digressão narrada põe o personagem vivendo a fantasia do que é abordado, diferentemente do início (que é real, mesmo sendo inacreditável). A cena pré-abertura (de humor-negro e tragicômica) encontra-se na China, em um barco num rio qualquer, com um casal aparentemente apaixonado. Ele vira-se para pegar as alianças e então um acontecimento inesperado e trágico: uma vaca cai do céu, literalmente. Aos poucos, entendemos que o porquê desse evento estranho. Com subtítulo de “Histórias de pescador ou para boi dormir”, o diretor direciona quem assiste ao universo do exagero e de fábula realista. Nosso personagem trabalha em uma loja de ferramentas, que foi de seu pai.
Há nele uma paciência beirando o limite aos clientes (desconfiados, ou que o fazem gastar tempo e ou os que perturbam mesmo – como o maníaco por estética) e à contagem de parafusos de uma caixa (inspecionando um por um até o final – 350). Assim, Roberto passa o seu dia-a-dia, falando sozinho com sua mãe, colecionando miniaturas de todo o mundo (por encomendas), lendo notícias absurdas em jornais e recortando as mais interessantes. O seu passado é presente. Ele não consegue a libertação. Primeiro com a ligação com sua mãe, que não a conheceu, depois pela perpetuação de seu pai. Ele tem dificuldades em manter um relacionamento. “Você tem a nobreza e a dor”, diz-se. A fotografia possui tom acinzentado, quase sem cor, contrastando com a vivacidade de alguns detalhes. Por tudo que passou, aprendeu a vivenciar sua individualidade de forma plena, sem brechas.
Não há espaço para o outro. Personifica a característica marcante deste povo: a impaciência cultural, permitida e aceitável por seus próximos. Em determinado momento, dentro de sua vida projetada, acontece algo. Um chinês é posto para fora de um taxi. A primeira pessoa a frente desse estrangeiro, que não fala espanhol, é Roberto, que pode ser considerado excêntrico, mas que sente pena e culpa, o humanizando. Eles não se entendem. Não falam a língua um do outro, mas se comunicam por gestos (que passam a mensagem pretendida). Roberto investiga a fim de “ajudar” o chinês, porque por um lado livra-se do problema imposto e recupera a sua “liberdade”, esquentando-se (e socando) com quem não é legal. A história do estrangeiro aos poucos é contada. Veio preso em um navio. Ali, troca uma cela por outra. “Não estou acostumado a ficar com outras pessoas”, diz. O estrangeiro precisa encontrar seu tio. O protagonista então segue em uma busca implacável a fim de excluir a presença do convidado incomodo. Impõe o prazo de sete dias.
“Se não, eu vou explodir”, diz. O chinês, o mesmo da história da pré-abertura, possibilita a ele uma libertação, recomeçar e vencer o mau humor latente e tão impregnado de sua alma. “Tudo tem sentido”, diz o “intruso”. De pouco em pouco, ele percebe a sua mudança e parte a um futuro diferente do que era antes. Aguarde o final dos créditos. Há cenas adicionais. Concluindo, um filme despretensioso, leve, que deixa acontecer, respeitando a inerência de seus personagens, não os julgando, mas fornecendo soluções para que essa transformação aconteça. Um filme que se perde em alguns momentos, criando um vazio narrativo. Vale a pena assistir. Recomendo. Levou mais de um milhão de pessoas aos cinemas argentinos. Seu orçamento foi de US$ 5 milhões.
O Diretor
Sebastián Borensztein nasceu em 22 de abril de 1963 , em Buenos Aires. Filho do famoso ator cômico Tato Bores, formou-se pela Universidad del Salvador na carreira de Ciências da Comunicação. Ele é responsável por escrever e dirigir quase todos os seus projetos, e foi pioneiro na implementação da unidade de tratamento para filme de televisão. Seu início foi com publicidade, em meados dos anos 80. Depois trabalhou como produtor, escritor e diretor de seu pai, entre 1988 e 1994, o que lhe valeu inúmeros prêmios . Criou a minissérie “O fiador” para o qual ele venceu todos os elogios, quatro prêmios Martín Fierro , inclusive prêmios de melhor diretor e Fundo de TV Broad Casting, a nomeação ao prêmios Emmy e da prestigiada Argentores , atribuído pela Asociación Argentina de Autores. Em 2000 foi agraciado com o prêmio Konex como um dos cinco melhores diretores da década e no mesmo ano criou “Tempo Final ”, emitido na Argentina pela Telefe durante os anos de 2000 , 2001 e 2002 e atualmente vai ao ar em mais de 50 países. Em 2005 , ele concentrou sua carreira no cinema, em filmes. Sua estreia “A sorte está lançada” (2005) ganhou prêmios internacionais, incluindo o Prémio da Crítica para o Discovery da França, o Latino Film Festival Toulouse ( 2006 ), o prêmio Rail D’Oc concedida pelo mesmo festival, o prêmio de Melhor Roteiro no Festival Latino de Cinema de Trieste, eo Prémio do Público no mesmo festival. Seu segundo longa-metragem é chamado “Out of Memory”, escrito com Benjamin Odell para Lionsgate e Televisa.