Pornô para principiantes
Não gozei
Por Victor Faverin
Um filme que retrata o início da carreira de um jovem diretor. O cinema norte-americano adora explorar a metalinguagem como forma de homenagear e discutir a Sétima Arte e também a si próprio, mas nesse caso não estamos falando de Hollywood. “Pornô para principiantes” (2019), longa-metragem dirigido por Carlos Ameglio, é uma coprodução uruguaia, argentina e brasileira que estreia nessa quinta-feira em plataformas digitais. Seria ótimo dizer que nos juntamos a nossos irmãos de fronteira para produzir mais um grande exemplar desse subgênero que já gerou clássicos e outro bocado de obras marcantes, mas este não é exatamente o caso.
Aqui, a história utiliza o humor para mostrar como um homem pode ser arrebatado pela paixão por uma mulher e usá-la como força-motriz para ter coragem de modificar toda a sua vida frustrante. O problema é que o desenrolar da trama é arrastado, a reviravolta não empolga e a dita comédia – salvo raras exceções – não faz rir. O fator que contribui para esses percalços, provavelmente, é o protagonista. Victor, interpretado pelo ator argentino Martín Piroyansky, não possui um desenvolvimento que inspire torcida ou que faça com que, ao menos, nos importemos com o que vai acontecer com ele. Isso se deve, em parte, ao seu egoísmo em não enxergar o que está além do umbigo: Aníbal (Nicolás Furtado), o amigo fiel e motivador e Letycia (Nuria Fló), a noiva apaixonada.
É certo que deixar de valorizar o que há de bom na vida e simplesmente perder-se nos obstáculos que vão aparecendo é algo próprio do ser humano. No entanto, se a nossa trajetória fosse condensada em 90 minutos, como um filme, mostraríamos, certamente, uma evolução, indo do ponto A ao B. A isso, dá-se o nome de “jornada do herói”, um conceito narrativo famoso por descortinar a gradativa obtenção de conhecimento que leva a uma conclusão satisfatória. E esse progresso não é observado nem ao menos no Victor do futuro, um padre que dá a impressão de apenas se preocupar em apressar ao máximo a missa para poder voltar aos seus próprios afazeres. Mas vamos ao pornô. O uso do segmento cinematográfico na história serve para idealizar a mulher (interpretada pela brasileira Carolina Mânica) que desperta fascínio no protagonista e nos demais a sua volta. Essa construção é satisfatória e o mistério envolto na personagem, uma experiente atriz, contribuem para que o público ainda mantenha certo interesse pela trama.
Falando nos pontos positivos de “Pornô para principiantes”, a ambientação que remete ao final da década de 1980 é bastante convincente, seja nos penteados (alguns mullets), roupas ou na fotografia com tons de sépia, remetendo à nostalgia. Parte disso se deve, também, a uma video-locadora que serve como parte do cenário. Em certo momento, o amigo do protagonista e funcionário do local diz que as multas aplicadas aos clientes que não rebobinam as fitas são educativas e que “daqui 35 anos, ninguém vai esquecer de fazê-lo”. É bastante sintomático que a internet tenha eliminado, de vez, a necessidade de se ir a um local para alugar filmes e, ao mesmo tempo, atingido em cheio as produtoras tradicionais de vídeos pornográficos.
Outro interessante paralelo explorado pela trama é a ideia do protagonista em fazer o filme que ele se vê quase obrigado a dirigir como uma adaptação cinematográfica de “A noiva de Frankenstein” (1935). A partir de então, vemos uma cômica escalação de elenco e a procura pelo “pênis correto” que, através da penetração, dará vida à criatura fêmea de laboratório. Engana-se, porém, quem pensa que “Pornô para principiantes” trará cenas de sexo explícito ou mesmo nudez. O mais perto disso são fotos em polaroide e uma transa levemente mais intensa entre marido e mulher, com foco apenas nas costas da personagem descoberta. Se o filme não buscasse atender a uma faixa etária tão abrangente, teria se beneficiado com um tom mais ácido e menos pastelão que, frequentemente, foge do tom e em nada contribui para o desenvolvimento da trama.
Assim como o protagonista da história, Carlos Ameglio iniciou sua carreira como diretor de curtas-metragens, centrado, portanto, na estética além da informação. Há vislumbres de tal experiência em “Pornô para principiantes”, mas pelo filme não se propor a nada além de gerar o riso fácil, acaba se perdendo na ideia do fazer por fazer, preso em sua própria metalinguagem sem explorar subtramas que levem o público à reflexão, por mais pueril que seja.