Direção: Esmir Filho
Roteiro: Esmir Filho, Ismael Caneppele
Elenco: Henrique Larré, Ismael Caneppele, Tuane Eggers, Samuel Reginatto, Áurea Baptista
Fotografia: Mauro Pinheiro Jr.
Trilha Sonora: Nelo Johann
Figurino:Andrea Simonetti
Edição:Caroline Leone
Produção: Sara Silveira, Maria Ionescu
Distribuidora: Warner Bros.
Estúdio: Dezenove Cinema e Televisão
Duração: 103 minutos
País: Brasil
Ano: 2009
COTAÇÃO: MUITO BOM
A opinião
O universo atual do individuo tornou-se vazio e sem sentido. “Estou cansado de não fazer nada”, diz-se. Este nada projeta sonhos de mudança. De abandonar o mundo o qual não pertencemos. Para isso temos escolhas, porém são mais traumáticas. O medo de deixar para trás o que se conseguiu e ou acumulou gera a resignação do momento acarretando a coragem do querer impulsivo e desesperado.
A dicotomia da facilidade interativa com outras partes do mundo e com pessoas contrasta com o individualismo solitário e exacerbado que se sofre sem motivo. A introspecção é o sentimento que mais explica os acontecimentos. O retorno a si mesmo é dilacerado e exposto, de maneira visceral, mas sutil, em um caminho que a espera por algo se torna comum e recorrente. A felicidade aceita transforma-se em inerência, limitando novos questionamentos e alienando a alma. Os efeitos colaterais podem ser observados por medicamentos de tarja preta e pela artificialidade das relações humanas. Os sonhos e alucinações concretizam-se por imagens digitais não focadas, humanizadas e sinceras que retratam o passado de instantes vividos e ou o desejo ainda não experimentado, mas vivo por lembranças reais ou imaginarias.
Baseado no livro homônimo de Ismael Caneppele, aborda a vida de um garoto de 16 anos, fã de Bob Dylan, tem acesso ao restante do mundo apenas por meio da internet, enquanto vê os dias passarem em uma pequena cidade rural de colonização alemã, no sul do Brasil. Mas uma figura misteriosa o faz mergulhar em lembranças e num mundo além da realidade.
As historias narradas criam a poesia do roteiro, que filosofa de forma jovem existencialista, mas com profundidade pop e não clichê. Transpassa o real sentir, característica importante para que o futuro venha a acontecer, para que o vazio não se transforme em um pular de uma ponte, para que a catarse não seja a morte.
A câmera interage em metalinguagem. Câmeras filmando câmeras, textos escritos em computadores, bate papos virtuais, edições de vídeo. O filme experimenta estilos, enquadramentos e retira do abstrato os sentimentos dos personagens, quando foca em seus olhos e escurece o resto, quando luzes e cores passeiam após usar maconha. Há uma cena virtual em que o próprio diretor Esmir Filho aparece refazendo um clipe de Bob Dylan.
“Naquela cidade era um mundo de segredos. Uma garota sem pernas ajudou um garoto sem nome a sair dali”, divaga um escritor de blogs a fim de expurgar palavras e libertar a própria alma. O longa descreve o dia-a-dia de seres que não se compreendem, que apenas sobrevivem um adia após o outro dentro de um ambiente simples e natural com temperaturas a cinco graus e paisagens em nevoas. A luz projeta o que quer. A câmera quase lenta deturpa a realidade e abre o entendimento do não precisar pensar por um momento. “Minha mãe esta cada vez mais louca”, ri-se. Vê-se a realidade com outros olhos.
O tempo da espera de uma vida jovem adolescente preserva-se, e competentemente dirigida. Esse tempo é necessário para realizar o processo ao espectador de visualizar a própria vida. Com isso faz com que a inserção a trama seja total.
Um homem aparece e encara dois jovens. Não se entende, mas depois as peças vão sendo juntadas. É uma historia sobre buscas e sobre o recomeço de uma vida após uma perda. A tensão dos momentos gera o incomodo do não ter o que fazer. O externo liberta, mas causa o medo. Já a casa, o interno, refugia.
O famoso, podendo ser a busca do cantor Bob Dylan – para assistir ao show ou como pretexto de galgar novos caminhos, ou os famosos, as pessoas que optaram por se salvar, mesmo sendo de uma forma não natural e entendida, pululam na boca e no inconsciente coletivo de uma comunidade interiorana, onde nada acontece, e quando uma festa é a opção, o foco muda e a felicidade parece ganhar força. Os duendes da morte existiram realmente? Só passaram por ali?
As imagens surreais, ora estágios mentais, ora computadorizadas, acrescentam o sofrer por algo que em um mundo atual não se é mais possível. A realidade tem que prevalecer e a vontade imaginada presa em sonhos e ou pesadelos. “Estou cansado de não fazer nada”, diz-se. O viver estranha-se nas cenas que a mãe bebe vinho com o filho, que conversa sobre sexo com ele e que personifica em humano um ser instintivo como uma cachorra. A atmosfera superficial retrata o distanciamento inter pessoal, que é afastada por fones de ouvidos, televisões e a falta de assunto. A solidão é explicitada quando uma professora de olhar triste olha para o personagem principal, o fã do Dylan, e o vê como seu filho. “Ela me olha como se fosse você”, ele diz. O desejo de querer o que não se tem. Parafraseando um ditado popular “A grama do vizinho é mais verde”.
“Estar perto não é físico”, eleva-se a ultima potencia e define por completo o estado dos personagens. Ele precisa aventurar-se. Descobrir as vivências. Vivenciar algo fora da tela do computador. Nem que para isso precise ir assistir ao show do seu grande artista. Há três opções: permanecer onde está, libertar-se pela morte ou salvar-se pela liberdade. “Eu não gosto de futebol. Me deixar sentado não ia incomodar ninguém”, expõe a imposição dos outros e o não respeito pela vontade de cada um. As metáforas aparecem. Um saco em uma garota respirando mostra o grau de não se agüentar mais. O espaço virtual internetesco “Pedaços de mim”, dentro de “Minha alma” sufoca e empareda o ser, demonstrando agonia e falta de ar. O foco e o não foco são os estágios da exposição. Ora sabendo que se pode aparecer para si mesmo e para os outros, ora desejando desaparecer e tornar-se apenas um borrão, como alguém que não usa os seus óculos de grau máximo de miopia para reparar com detalhes o que se passa.
O filme remete a um universo do diretor Gus Van Sant e suas vivencias adolescentes. As coisas nessa idade são superexpostas, cada gota de chuva inunda mais uma estrada. A clássica musica “The Tambourine Man”, de Bob Dylan, esta no bate papo e toca. “Às vezes tenho nojo de mim”, diz-se. “Voe para longe”, responde-se. A tecnologia pode ajudar ou atrapalhar o processo de auto conhecimento. Há uma cena que não atrapalha o contexto. A conversa dele com os avôs. Os diálogos não convencem. Mas como disse não atrapalha o contexto.
“Os resgates cada vez demoram mais”, diz-se. “Pressa para que? Ta morta mesmo”, responde-se. O suicídio supre o vazio. A ponte é a saída. Logo um elemento filosófico, já que liga algo a algo. A mensagem que se passa é que mesmo com este ato radical, a vida permanece no mesmo lugar. “Deixa os anos passarem e você vai ver que o seu tempo ficou aqui nesta casa”, diz-se. A saída pela luz, pelas estrelas ou pela ponte, despedindo-se em uma festa junina, e deixar que o passado fique no passado, que um novo futuro venha, isso tudo pode ser concluído ou não do roteiro. A subjetividade de cada um define o entendimento deste belo filme que merece muito ser visto. Recomendo. Melhor Filme (Júri e Crítica Internacional) do Festival do Rio 2009. Selecionado para a mostra Generation 14plus da Berlinale 2010.
Esmir Filho graduou-se em Cinema na FAAP em 2004. Dirigiu vídeos experimentais e premiados curtas-metragens. Seu curta “Ímpar Par” levou o prêmio de melhor filme no Festival de Cinema de Kiev, Ucrânia, e de Huelva, Espanha.
Seu outro curta, “Alguma Coisa Assim”, realizado pelo 10º Festival Cultura Inglesa, conquistou o prêmio de melhor roteiro no Festival de Cannes 2006, além de ter sido premiado como melhor filme nos Festivais de Cinema de Kiev (Ucrânia), Biarritz e Gramado, onde também levou o prêmio de melhor direção. O curta também recebeu também prêmio de melhor curta concedido pelo Itamaraty.
Esmir é um dos realizadores do vídeo fenômeno da internet, “Tapa na Pantera”, que ultrapassou da marca de 10 milhões de espectadores. Em setembro do ano de 2006, recebeu o V Prêmio Jovem Brasileiro pelo governo do Estado de São Paulo, concedido pelo mérito dos jovens na sociedade pelo reconhecimento na área e empenho profissional.
Seu curta “Saliva” também estreou no Festival de Cannes 2007 e recebeu o prêmio de melhor direção no Festival de Gramado 2007. Desde 2005, dirige filmes e conteúdos audiovisuais para a produtora paulistana Ioiô Filmes.
Filmografia
2009 – Os Famosos e os Duendes da Morte
2007 – Saliva (Curta-metragem)
2006 – Alguma Coisa Assim (Curta-metragem)
2006 – Tapa na Pantera (Curta-metragem)
2005 – Ímpar Par (Curta-metragem)
2004 – Ato II Cena 5 (Curta-metragem)
1 Comentário para "Crítica: Os Famosos e Os Duendes da Morte"
Olá, rapazzzz….
Em uma pesquisa no google cheguei a este agradável espaço!! Gostei e volto para ler mais. Posso listar seu site em meu blog?
Abraços,
Kleber
oteatrodavida.blogspot.com