Diretor: Christophe Van Rompaey
Roteiro: Jean-Claude Van Rijckeghem, Pat van Beirs
Elenco: Barbara Sarafian, Jurgen Delnaet, Johan Heldenbergh, Anemone Valcke, Sofia Ferri, Julian Borsani, Bob De Moor, Jits Van Belle, Griet van Damme
Fotografia: Ruben Impens
Trilha Sonora: Tuur Florizoone
Produção: Jean-Claude van Rijckeghem
Distribuidora: Filmes da Mostra
Estúdio: A Private View
Duração: 102 minutos
País: Bélgica
Ano: 2008
COTAÇÃO: BOM
O diretor Christophe Van Rompaey estreia na direção com “Moscou, Bélgica”. Um filme eclético de gêneros, porquê mistura comédia e drama. Moscou é o nome de um bairro periférico de Ghent, na Bélgica, com uma densa classe trabalhadora. Matty (Barbara Sarafian), 41 anos de idade, três filhos, bate seu carro contra um caminhão no estacionamento de um supermercado. Johnny (Jurgen Delnaet), 29 anos, pula da cabine, enfurecido pelo amassado no pára-choque dianteiro, gritando com Matty. Chocada com o acidente, ela responde com sarcasmo. A discussão transforma-se numa violenta briga e a polícia tem de intervir. De volta a seu apartamento, Matty está tomando um banho para se recuperar das emoções vividas, quando o telefone toca. É Johnny desculpando-se por seu comportamento anterior. A sinopse acima pode soar como óbvia e clichê (com a sensação de já ter visto inúmeras histórias como esta). A diferença está na forma que o diretor conduz a trama. O roteiro despretensioso não busca ser nada, apenas contar de maneira divertida, inteligente e realista, usando o cotidiano (e o acaso) para seguir os próximos acontecimentos na vida de seus personagens. A camera interage com o espectador, tornando-a não mais observadora, mas sim incluída como elemento narrativo interpretativo. Pode-se inferir que seja os olhos de quem está do outro lado da tela, que seja mais um personagem visível ou não.
Mostra ações banais de uma família comum. O supermercado, as compras, os problemas, conflitos, tudo ambientado quase amador. Assim explicita ao máximo o realismo e consequentemente o seu convencimento. A “falsa” modernidade de aceitação plena, sem reclamações, de suas próprias vidas, conflita-se com o que realmente são. Neste novo estilo, não há lugar explosões de humor e sentimentos angustiantes – e ou sôfregos. Então, é de esperar momentos de catarse, já que se apresentam como humanos. Eles descontrolam-se por qualquer reviravolta. Na verdade, os personagens cavam pelos instantes que possam descontar a raiva contida e guardada, por tempos, no outro. Se um acontecimento pede por essa atitude, então eles não perdem a oportunidade. Esse comportamento os define como passionais, “agem antes, pensam depois”, não medindo as consequências, estas que dão as próximas fases do que se assiste. Eles são embrutecidos, defensivos, agressivos, cínicos, sarcásticos e buscam a individualidade, porém objetivam serem cuidados e amados. Qualquer atenção, desencadeia o despertar do que se almeja e sonha há tempos. “Lecca-lecca: pirulito na Itália”, diz-se entre as muitas referências ao país italiano. A fotografia complementa o que se assiste.
É nostálgica, suja (como se acordasse pela manhã e ainda não tivesse tomado banho e escovado os dentes), visceral, alaranjada (buscando a esperança e a volta da cor de uma foto envelhecida) e amadeirada (desejando o material bruto), como a taça de vinho na banheira. A cena é tão clara, saturada mais ao branco, que o líquido se sobressai. “O marido na meia idade (crise), a filha adolescente” e uma vida que nada acontece são os “empecilhos” do seu caminho. Contudo, o diretor não foi feliz ao escolher os momentos musicais, que tentam suavizar a carga emocional da história, dando um toque sutil de esperança esperada. Pois é, não funciona. Quebram-se cenas interessantes por ter a música errada no instante errado. Não impede a imersão à trama, mas que incomoda, isso é fato. O filme fez com que eu me remetesse à atmosfera do diretor Fatih Akin, de “Soul Kitchen” e “Julia em Julho”. Entre picardias, diálogos diretos – e afiados, embates ciumentos e simbolismos metafóricos (como o sapato pequeno, que leva tempo para se acostumar), o roteiro é aprofundado. Esse elemento já é o necessário por suavizar. “Estou aqui para chatear meu marido, não tenha ilusões”, diz-se uma coisa, querendo dizer outra. São solitários, com medo exacerbado de se machucarem. “Uma noite sem amor é uma noite perdida”, galanteia-se. Há o naturalismo. A nudez comporta-se normal, como deve ser, sem a encenação. As expressões faciais de interpretação de seus personagens resumem satisfatoriamente a experiência do espectador. Concluindo, um longa divertido, inteligente, com seus altos e baixos, extremamente competente, principalmente por ser livre e deixar acontecer naturalmente. Recomendo. Grand Golden Rail e Prêmio Acid no Festival de Cannes 2008. Melhor Composição (Tuur Florizoone) do European Film Awards de 2008.
Christophe Van Rompaey nasceu em 18 de abril de 1970, Gent, Bélgica. Depois de dirigir inúmeros seriados para a televisão belga, realizou sua estreia com “Moscou, Bélgica”, sobre o bairro Moscou, que não fica na Rússia, e sim na Bélgica.