Direção: Lucy Walker, João Jardim, Karen Harley
Elenco: Vik Muniz, Fabio Ghivelder, Isis Rodrigues Garros, José Carlos da Silva Baia Lopes (Zumbi), Sebastião Carlos dos Santos (Tiao), Valter dos Santos, Leide Laurentina da Silva (Irmã), Magna de França Santos, Suelem Pereira Dias
Fotografia: Dudu Miranda
Música: MOBY
Montagem: Pedro Kos
Duração: 99 minutos
País: Brasil
Ano: 2009
COTAÇÃO: MUITO BOM
Vicente José de Oliveira Muniz, internalcionalmente conhecido como Vik Muniz, nasceu em 1961. É um artista plástico, fotógrafo, desenhista, pintor e gravador paulistano, radicado em Nova Iorque, desde 1983, realizando séries de trabalhos nas quais investiga, principalmente, temas relativos à memória, à percepção e à representação de imagens do mundo das artes e dos meios de comunicação. Ele faz experimentos com novas mídias, usando técnicas diversas e empregada nas obras, com freqüência, e materiais inusitados como açúcar, chocolate líquido, doce de leite, catchup, gel para cabelo, lixo e poeira. É um dos maiores e respeitados, mundialmente, artistas contemporâneos. “Quanto mais significado tem o trabalho, mais inacreditável e emocionante. Com isso, aprendi a lidar com os meus preconceitos. Passei três anos sobrevivendo do outro lado da sociedade. Uma experiência enriquecedora observar o que esta sociedade consome e o que joga fora”, disse Vik, com seu senso de humor puro e nato, em tarde de estreia, durante o Festival do Rio, no Cinema Odeon. “Cinema é feito por todas as pessoas e tem a sua importância. A arte social provoca mudanças, sem parâmetros sociais”, complementa. O documentário de Lucy Walker, João Jardim e Karen Harley aborda um momento na vida de Vik: da ideia à concepção de se usar o lixo como forma de arte. Inicia-se já pela fama, no Programa do Jô, da Rede Globo de Televisão, o entrevistando. Jô Soares deixa a pergunta no ar: “Por que do lixo?”. A seguir, mostram-se as variadas formas de formação do lixo, em 1988. E em 2007, o artista nos Estados Unidos. A narrativa situa o espectador em anos. Há metáforas visuais sobre a ideia do material do que é feito. O açúcar, por exemplo, é mostrado como “a doçura tirada de crianças pobres”, em simbolismos de suas obras. Ele visiona o lado humano do individuo, não acreditando que ninguém é o melhor que o outro. “Vale a pena tentar a vida de pessoas”, diz.
Com a aceitação do projeto, viaja de Nova Iorque ao Rio de Janeiro. Jardim Gramacho, o maior aterro de lixo do mundo, para ser mais exato. Retrata-se o processo de coleta à obra final, explicando, assim, a importância do catador – que aumenta a vida útil. “É a cidade do lixo”, diz-se. “Lixo de milionário mistura-se a de um ‘favelado’”, complementa-se. Vik busca como objetivo pessoal de vida a simplicidade. “A felicidade simples pelas pequenas coisas”. O longa dá voz às reinvindicações dos catadores e aborda um meio de vida. É material bruto e etnográfico. “Tem que saber selecionar os livros. Li ‘Código da Vinci’ e ‘A arte da guerra’”, expressa-se animação aditada pela trilha sonora new age, que cria o ambiente e permite o mergulho no lúdico do realismo. “O inicio, consegue-se ver o pequeno na imensidão”, ensina-se. “A luta é grande, mas a vitória é certa”, defende-se acreditando na vitória plena e no sucesso. “99 não é 100. Uma latinha faz diferença”, acrescenta-se. Os personagens misturam-se. Ora os catadores, ora o artista, ora o lixo e ora a própria camera – criando a metalinguagem de transpor ao espectador a sensação do que se vê. Este mundo é apresentado por tiradas engraçadas “defuntos = coisas esquisitas”, por cultura contrastada “Maquiavel e Nietzsche” e pelo que comem “costela ensopada”. É inevitável o nosso questionamento. “Para onde vai o lixo?”. A fotografia segue embasando o filme, ganhando atenção especial à noite, principalmente quando a luz do fogo aparece, refletindo uma agilidade e participação, com o foco perdido.
Do que se joga fora, a equipe recolhe e gera formas artísticas. Então, o lixo é arte? O que se come é arte? Ou é preciso vocação para saber distinguir o certo e ou errado da escolha do que usar? O documentário destaca os valores milionários que a obra final foi arrematada em um leilão. “Conhece-se (e define-se) a pessoa pelo lixo (pelo que consumiu)”, diz-se. “Se aproxima-se vê o material utilizado, quando se afasta vê a imagem”, ensina-se e mostra a imagem projetada com o material em cima. Uma outra parte do filme é mostrar o lugar o qual Vik nasceu. O documentário desperta a sensibilidade, pela emoção do espectador, desencadeando o choro (fácil) sem ser melodramático e ou manipulador. Segue-se pela naturalidade crua. Por isso, o sentimento é verdadeiro e o filme tão interessante de se assistir. O artista, extremamente familiar, forneceu aos pais uma vida decente. Já a dos catadores, com a oportunidade do filme, obtiveram a “permissão” para reclamar de suas vidas resignadas (da pobreza) e vitimadas. Questionam-se sobre se não é cruel fornecer uma pequena chance a estas pessoas, e depois colocarem de novo na mesma vida que tinham. “A arte pelo conhecimento. Maluco é quem compra”, diz-se rindo sobre a definição de arte moderna, passando pela exposição no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro e o que aconteceu com cada um dos personagens retratados no documentário. Concluindo, um filme sensível, social, íntegro, não sensacionalista, não pretensioso e incrivelmente poético, usando o principal elemento do ser humano, que é ser o que é para transforma-lo em arte.
Diretores
Direção conjunta dos cineastas brasileiros João Jardim e Karen Harley e da documentarista inglesa Lucy Walker. João Jardim é diretor dos premiados documentários Janela da Alma e Pro Dia Nascer Feliz. Lixo Extraordinário é o primeiro longa-metragem de Karen Harley, que já realizou vários curtas sobre artistas brasileiros. Lucy Walker dirigiu também Countdown to Zero e Blindsight, entre outros.