Direção: Emmanuel Laurent
Roteiro: Antoine de Baecque
Elenco: Jean-Luc Godard, Jean-Pierre Léaud, François Truffaut, Isild Le Besco
Fotografia: Nicholas de Pencier, Etienne Carton de Grammon
Direção de Arte: Eric Pierard
Edição: Marie-France Cuénot
Edição de som: Jena Dubreuil e Henti Maikoff
Produção: Emmanuel Laurent
Distribuidora: Imovision
Estúdio: Films a Trois
Duração: 91 minutos
País: França
Ano: 2009
COTAÇÃO: ENTRE O BOM E O MUITO BOM
Apresentação
A Nouvelle vague (Nova onda) contesta o próprio cinema francês dos anos sessenta. A expressão foi lançada por Françoise Giroud, em 1958, na revista L’Express ao fazer referência a novos cineastas franceses. Sem grande apoio financeiro, os primeiros filmes seguiam o caminho da experimentação, características da juventude dos seus autores, unidos por uma vontade comum de transgredir as regras normalmente aceitas para o cinema mais comercial.
Em tom de celebração dos 50 anos da Nouvelle Vague, o documentário relembra a apresentação de Os Incompreendidos, de François Truffaut, no Festival de Cannes em 1959, e a criação de Acossado, de Jean-Luc Godard, mostrando assim o nascimento do movimento que mudou a forma de se fazer cinema na França e revelou ao mundo dois dos maiores cineastas de todos os tempos, Truffaut e Godard. Retrata também a amizade naquela época entre os dois artistas de personalidades tão opostas.
As características mais marcantes deste estilo foram a intransigência com os moldes narrativos do cinema estabelecido, através do amoralismo, próprio desta geração, presente nos diálogos e numa montagem inesperada, original, sem concessões à linearidade narrativa. Os autores desta nova forma de filmar detestavam muitos dos grandes sucessos caseiros do cinema francês. Eles voltavam-se às obras de Jean Delannoy, Christian-Jacque, Gilles Grangier, Aurenche e Bost (argumentistas). Ao mesmo tempo elevaram à divindade os mestres do film noir americano, Jean Renoir, Robert Bresson, Jacques Tati e Jean Vigo.
O estilo adotado não fornecia proteção aos seus autores e realizadores. A estética narrativa deste documentário que retrata, de forma didática, linear e sem grandes experimentações, o universo de seus fundadores, inicia com uma mulher folheando a revista Cahiers du cinéma, que teve os protagonistas deste documentário como colaboradores. Os filmes “Os Incompreendidos”, Francois Truffaut e “O Acossado”, de Jean-Luc Godard, estão presentes, quase íntegros na tela. Eles buscavam a renovação. O cinema jovem estava na moda, mas não lotava as sessões.
No primeiro filme do Truffaut, o diretor diz que nada foi inventado, que utilizou elementos autobiográficos para a construção da trama. Ele trabalha com o mínimo de ficção. “Eu ia ao cinema para distrair, ver as imagens”. O filme representou a França no Festival de Cannes. Com o sucesso, Truffaut oferece “Acossado” a Godard. Godard buscava a sinceridade do cinema, naquilo que ele fazia. “Estava tudo terrível”, ele dizia. “Um filme de valor”, era esperado. Os prêmios chamaram a atenção ao este tipo de cinema. O documentário aborda Eric Rohmer, Jacques Rivette e Claude Chabrol, que fazem parte do grupo de críticos da revista Cahiers du Cinéma que se tornaram posteriormente cineastas, além dos outros já comentados aqui. Andre Bazin, que morreu jovem, aos quarenta anos de idade, era o mais importante pensante. Ele era considerado “mais que um crítico”, com seu espírito tolerante. Era um mundo entendido do universo dos cinéfilos.
A estranha e criativa união de Truffaut e Godard, por serem extremamente diferentes, completava-se pelo ativismo político a favor da sétima arte. Criticavam a ética burguesa de ser. A amizade entre eles estruturava-se a ferro e fogo. “A vida era a tela”, dizia o Francois.
O documentário apresenta fotos, que são jogadas uma em cima da outra, objetivando o amadorismo. “Cinefilia é a criação do olhar. Uma paixão em tempo integral. Viver para o escuro da sala. A educação do olhar”, ensina-se. O estilo, considerado sarcástico, inteligente e questionador, inclui referências cinematográficas de Fritz Lang, Roberto Rosselini, Orson Welles, Ingmar Bergman e Jean Renoir, este último “nunca errou e nunca blefou”. “Uma obra-prima é um erro melhorado”, diz Godard.
“Nós filmamos a vida. A camera é a arte”, expressa-se com autoridade da própria crença de possuir a certeza que este é o caminho. Há a prepotência dos jovens e dos franceses. São incluídas, no documentário, cenas de “O pequeno soldado” e “Tempo de Guerra”, de Godard, Jacques Demy, “Atirem no pianista”, de Truffaut. Há também a cena de “A religiosa”, de Rivette, proibido na época por comparar uma freira, obrigada ao convento, a uma execução de morte.
“A idiotice da guerra vem da idiotice das pessoas”, diz Godard, com sua língua presa característica, em resposta às cenas sensacionalistas de “O mais longo dos dias”. Eles preservavam a ingenuidade da luta, do que acreditavam. Eles brigam pelos cineclubes franceses. O enfoque era Henri Langlois, um dos fundadores da Cinémathèque Française. Com isso, houve o cancelamento do Festival de Cannes daquele ano.
Jean-Pierre Léaud estreou como ator de cinema aos 15 anos, no papel de Antoine Doinel, alter-ego de Truffaut, em “Os Incompreendidos”. Léaud protagonizou mais quatro filmes de Truffaut que mostravam a vida de Doinel, ao longo de um período de 20 anos – ao lado da atriz Claude Jade como a sua namorada e depois esposa. Ele foi considerado o “Filho da Novelle Vague”. “É precisão o que ele (Godard) quer com os atores”, diz.A mudança veio brusca. A amizade entre Trufaut e Godard abalou-se. Enquanto o primeiro buscava realizar apenas histórias de cinema, sem envolver-se com política. O segundo embarcou em um novo cinema. Um cinema político e em muitos momentos incompreendido. Há filme com Glauber Rocha “Vento do Leste”. Há visões fantasiosas da Guerra, como “Nossa Música”. O filme “A noite americana” foi a quebra da união dos dois. Com farpas e alfinetadas recíprocas. Truffaut nadou em direção a mesma onda americana, morrendo em 21 de outubro de 1984, e Godard, um completo revolucionário com sua política radical. Este ano, no Festival de Cannes apresentou o seu último projeto “Film Socialism”, mais uma vez adorado por uns, odiado por outros. Assim é Godard, o ame ou o odeie.
O documentário é uma aula da Novelle vague. Didática, informativa, porém comum. Acrescenta informação aos que não sabem. Repete o que já se disse, sem incluir nada de novo. O espectador é envolvido, principalmente os cinéfilos. Há o gostinho de querer rever os filmes. Mas quem não conhece o estilo, ficará encantado. Um bom filme para despertar a vontade de assistir novamente aos filmes da Nova Onda. Recomendo. Selecionado para o panorama Clássicos do Festival de Cannes em 2009.
Emmanuel Laurent, escritor e cineasta, aprendeu por conta própria a filmar sentando na primeira fila da Cinemateca e trabalhando com edição. Em 1984, ele fundou a produtora independente Films à Trois, que ele dirige com Martin de la Fouchardière.
Além de Godard, Truffaut e a Novelle Vague, ele dirigiu mais de 20 longa metragens e curtas documentários.
Laurent conta que sua ideia era fazer um filme sobre a nouvelle vague. Encontrou-se Antoine de Baecque, que já havia escrito a biografia de Truffaut e, na ocasião, trabalhava na de Godard. “Além disso, Baecque é crítico de cinema e historiador profissional, com obras sobre o século 18 francês. Sabe pesquisar um arquivo e dele extrair informações. Foi um parceiro ideal, sem o qual o filme não existiria”, diz.
“Já havia filmes sobre a nouvelle vague, alguns muito bons; preferi então tratar dessa amizade problemática, coisa que ninguém ainda havia feito. Desse forma encontrei um eixo para o filme.”
Godard
1959 – Acossado
1960 – O Pequeno Soldado
1961 – Uma Mulher é Uma Mulher
1962 – Viver a Vida
1963 – Tempo de Guerra
1963 – O Desprezo
1964 – Bande à part
1964 – Une femme mariée
1965 – Alphaville
1965 – O Demônio das Onze Horas
1966 – Masculine-feminine
1966 – Made in U.S.A.
1967 – Deux ou trois choses que je sais d’elle
1967 – A Chinesa
1967 – Weekend
1955 – Uma Visita
1957 – Os Pivetes
1958 – Une Histoire D’Eau
1959 – Os Incompreendidos
1960 – Atirem no Pianista
1962 – Jules e Jim – Uma Mulher para Dois
1962 – Antoine et Colette – O Amor aos Vinte Anos
1964 – Um Só Pecado
1966 – Fahrenheit 451
1968 – A Noiva Estava de Preto
1968 – Beijos Proibidos
1969 – A Sereia do Mississippi
1970 – O Garoto Selvagem
1970 – Domicílio Conjugal
1971 – Duas Inglesas e o Amor
1972 – Uma Jovem Tão Bela Como Eu