Curta Paranagua 2024

Crítica: Domingos
Ficha Técnica
Direção: Maria Ribeiro
Roteiro: Maria Ribeiro
Elenco: Domingos Oliveira, Priscila Rozenbaum, Maria Mariana, Paulo José, Pedro Cardoso
Fotografia: Lula Carvalho, Manoel Aguas, Haroldo Borges
Edição: Jordana Berg
Produção: Renata Paschoal
Estúdio: Gávea Filmes / Prole de Adão
Distribuidora: Forte Filmes
Duração: 74 minutos
País: Brasil
Ano: 2009
COTAÇÃO: ENTRE O MUITO BOM E O EXCELENTE
A opinião
“Domingos” possui ao espectador adentrar na vida e obra cinematográfica do dramaturgo e ator Domingos José Soares de Oliveira, carioca, nascido em 28 de setembro de 1936. A responsável é a estreante na direção, a atriz Maria Ribeiro, que desde 2002, quando trabalhou no filme “Separações”, teve a idéia de documentar o dia-a-dia, considerado por muitos, o nosso Woody Allen brasileiro, sempre tendo em mente a realização de um curta-metragem. Foi o próprio Domingos que, em 2005, sugeriu que ela fizesse um longa-metragem. Nesta trajetória, Maria capta manias, “achismos”, percepções filosóficas do personagem principal, apaixonado pelo escritor russo Fiódor Dostoiévski e influenciado pelos cineastas François Truffaut, Jean Luc Godard, Charles Chaplin e Frederico Fellini. Domingos de Oliveira é basicamente um homem que insere o teatro no cinema, assim como na sua vida e na de quem assiste seus quase documentários cotidianos. Isto porque imprime naturalidade e realismo nos diálogos, os deixando críveis e possíveis, mesmo quando apresenta o lado absurdo da vida. Em “Todo Mundo Tem Problemas Sexuais”, em 2009, o Vertentes do Cinema analisou a fundo este diretor, que também “exerce” as funções de poeta “maldito” – e “existencial”. Domingos consegue definir de forma humanizada características intrínsecas de seus personagens, utilizando sarcasmo inteligente e perspicaz. A sagacidade apresentada, pelo humor debochado (quase de escracho), não possui o papel de julgar e sim de retratar elementos pessoais de cada um dos indivíduos. A sua filmografia mescla nostalgia, classicismo, lembrança com modernidade – por usar o cotidiano em cada um dos seus filmes. É extremamente crítico, embrenhando-se na poesia analítica da base concreta, inserindo questionamentos, neuroses, surrealismo aceitável no que faz. Ele passeia pela religião e pelo profano, pela elegância e pela vulgaridade, pela pena e pela culpa.
As idiossincrasias interpretadas podem ou não ser autobiográficas e ou podem ser apenas de percepções mundanas. A sua obra permite a quem se permite uma experiência sensorial única, rica, deliberadamente poética, lúcida, lúdica e ao mesmo tempo busca a fantasia a fim de suavizar e transpor com leveza os temas de intolerância verborrágica. Seus personagens vivem no limite entre inteligência e burrice, liberdade e “prisão” social, desprendimento e culpa. Os filmes “dominguianos” comportam-se como projetos autorais, sem a importância demasiada aos elementos técnicos cinematográficos. Ele usa basicamente uma filmadora digital para que assim retrate estágios interioranos dos protagonistas (já que os presentes na história são igualmente necessários). A narrativa é pessoal e híbrida. Há conversas interativas, histórias digressionais – que servem como explicações do que é narrado, misturando teatro e cinema. Exprime um realismo objetivo, gerando a ontologia, que trata da natureza do ser, da existência dos entes e das questões metafísicas em geral, presentes em várias obras de arte referenciadas no roteiro do próprio diretor. “Emprestar ao cinema poderes que o teatro tem”, diz o protagonista do filme em questão. Podemos perceber a sutil referência ao universo de Carlos Zéfiro, por abordar o sexo, e a necessidade do encontro sexual, como inerente ao objetivo humano, sem utilizar a vulgaridade que um tema como este pode transpassar. Maria Ribeiro conheceu Domingos aos 19 anos, enquanto que ele tinha 58. Ainda indecisa entre ser atriz ou seguir carreira no Jornalismo, foi por causa do poeta, retratado aqui, que ela escolheu a primeira opção.
Foram ao todo oito anos de filmagens. Apenas estreou em circuito comercial em dois de dezembro de 2011, mais de dois anos após sua primeira exibição. A cineasta acompanha o dia-a-dia de Domingos, revelando facetas da intimidade dele, tendo como pano de fundo a celebração dos setenta anos do diretor. São momentos únicos, como as conversas na cama e a música “That´s Life”, ensaiada exaustivamente à peça de teatro. Nós o entendemos melhor, nós rimos, nós nos deliciamos com as inúmeras neuroses (reais e ou fictícias) em frases de efeito, ao mesmo tempo, que segue em paralelo melodrama e realismo. Chega a ser difícil definir por completo sua obra, devido à multiplicidade de vertentes pensantes. Domingos, num primeiro momento, diz não acreditar no motivo do seu sucesso, para logo depois voltar atrás e afirmar que é muito bom, instaurando uma falsa modéstia dentro da própria modéstia, recheando de metalinguagem, metáforas, parábolas e de melancolias não necessariamente entristecidas. A diretora (de “Histórias de Amor Duram Apenas 90 Minutos”, “Ouro Negro”, “Tropa de Elite 1 e 2”, “Tolerância” e “Xangô de Baker Street”) colocou uma tremenda responsabilidade nos ombros. Mas quanto mais a estrutura “domingos” é analisada, mais se percebe que por dentro de todo este universo sarcástico, criado por elem há uma previsibilidade, uma carência e uma indecisão tamanha que o torna extremamente humano, mesmo quando provoca o lado religioso. Tudo não passa de uma grande defesa pessoal. “Domingos” é um filme lido. Que se aprende e conhece sobre a obra de um dos mais talentosos e inteligentes realizadores de cinema, que mescla poesia e submundo. Há o ditado “Sarcasmo é sinal de inteligência”, neste ponto, Domingos ganha o prêmio máximo, obrigando ao leitor espectador embarcar integralmente nos sete dias da semana. Obrigado Maria Ribeiro! Vale muito à pena assistir. Recomendo.
A Diretora
Maria Ribeiro, de nome completo Maria do Amaral Ribeiro, (Rio de Janeiro, 9 de novembro de 1975) é uma atriz brasileira e agora cineasta. Trabalhou em telenovelas como A Escrava Isaura, interpretando a bela Malvina, e também Luz do Sol, interpretando Zoé. Fez também a jovem Anamaria no filme Tolerância, dirigido pelo diretor gaúcho Carlos Gerbase. Teve um filho com o ex-marido Paulo Betti, João, nascido em 2003. Está casada com o ator Caio Blat de quem teve seu 2° filho, Bento, nascido em 2010.
Filmografia como Atriz
2000 – Tolerância
2001 – O Xangô de Baker Street
2002 – Separações
2007 – Tropa de Elite
2009 – Ouro Negro – A Saga do Petróleo Brasileiro
2010 – Histórias de Amor Duram Apenas 90 Minutos
2010 – Tropa de Elite 2

Pix Vertentes do Cinema

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