Curta Paranagua 2024

Crítica: TOC – Transtornada, Obsessiva e Compulsiva

TOC-poster

Um Filme Insanamente Engraçado

Por Fabricio Duque

É lógico e inquestionável afirmar que em todas as categorias da vida há exceções. No gênero de comédia não poderia ser diferente. A maioria, sim, busca a fácil zona de conforto do humor caricato e paspalhão. Algumas descolam-se desta fórmula e apresentam “vida inteligente” e riso espontâneo por situações cotidianas, em que a graça se faz presente como um elemento intrínseco. Um deles é o filme “TOC: Transtornada, Obsessiva e Compulsiva”, que imprime um humor negro politicamente incorreto defensivo à moda das esquetes do “Porta dos Fundos”; da naturalidade comportamental de “O Roubo da Taça”, de Caíto Ortiz; e da despretensão de “La Vingança”, de Fernando Fraiha e Jiddu Pinheiro.

“TOC: Transtornada, Obsessiva e Compulsiva”, dirigido por Paulinho Caruso e Teo Poppovick, tem como protagonista a atriz Tatá Werneck (que disse na coletiva que o humor é uma ferramenta política” e que se não fosse neste filme não teria “condições e chances de beijar seu par romântico Bruno Gagliasso”, é gargalhada certa do início ao fim, inclusive nos momentos que mais manipulam o espectador ao riso fácil.

O filme conta a trajetória de Kika K, uma atriz que está em novelas, campanhas publicitárias e é idolatrada por milhões de fãs. Mas por trás das aparências, está em crise com sua vida pessoal e profissional, enquanto precisa lidar com as limitações de seu Transtorno Obsessivo Compulsivo. Kika se depara com Felipão, um fã obsessivo “número um” (Luis Lobianco), um fútil e viciado em sexo (carregando sempre uma “pepeca portátil”) namorado “perfeito” galã (Bruno Gagliasso), os compromissos profissionais marcados pela exigente empresária (Vera Holtz) e a tentativa de recomeço ao “esbarrar” com um atendente “fracassado perfeito” “babaca” de uma livraria (Daniel Furlan, que é um dos atores que também integra “La Vingança”).

Na pré-estreia que aconteceu no Shopping Downtown na Barra da Tijuca, Rio de Janeiro, cenário mais que perfeita como metáfora do filme, Tatá e Daniel fizeram uma apresentação introdução engraçadinha dizendo que a presença da “concorrente” Ingrid Guimarães (de “De pernas para o ar”) é apenas um “chamariz”.

“TOC: Transtornada, Obsessiva e Compulsiva” inicia-se por um possível sonho e ou uma projeção inconsciente de sua personagem principal e ou o cenário da nova novela “Amorgeddon”, que é ambientado em um futuro “walking dead” videogame apocalíptico, como um “Mad Max” (com mascarados “monstros”) meio “X-Men”. Ela, “a salvação”, uma “mulher maravilha” anti-heroína (“olha o teu tamanho” – que além do TOC, é hipocondríaca), antes de matar, arruma a roupa. Tudo em sua vida é reafirmar dia após dia um conto-de-fadas à mídia (ávida por futilidades) e aos fãs, e “pular amarelinha” nas cores do piso do aeroporto.

Até mesmo ter um livro “1003 maneiras de ser feliz” publicado por um escritor fantasma, que lança o desafio do jogo a forca: o que é felicidade plena com cinco letras? Esta resposta que só será revelada na última cena pós créditos. Portanto, se o caro leitor-espectador for curioso, não levante da cadeira do cinema até o último segundo da exibição. “Auto-ajuda não é Platão e poesia é coisa de mendigo”, diz-se à frente de seu retrato como Frida Kahlo (quase uma existência Romero Britto).

Aqui, a narrativa tende a captar a sinestesia do público, como os efeitos colaterais e alucinógenos de um psicotrópico “M&M”, à moda de um “Réquiem para um sonho”, de Darren Aronofsky, Kika (talvez uma referência a “Kika”, de Pedro Almodóvar”), como por exemplo, o tempo pausado, em câmera lenta, da “diva celebridade” passando por seu fãs. Ela, “médio-bonita”, de choro “estranho”, de “astral negativo”, deprimida, melancólica, apática, resignada (um produto criado “Britney Spears”), que ficou conhecida por um papel em uma novela estilo “Betty, a Feia” mexicana de ser, sem perspectivas, troca canais, zapeando, encontra a metáfora flash em “Macunaína”, tecla com seu namorado e manda “nudes” (para a “relação não morrer”). Uma vida comum, ordinária e normal, com seus toques, defesas e fugas, e que tenta acreditar que a “felicidade está nas pequenas coisas” (com doses homeopáticas de epifania).

Tudo aqui é crítico, redesenhado com referências do nosso mundo midiático ao redor. Os programas de televisão com apresentadoras famosas; o namorado que só existe para complementar as revistas de fofocas, os testes-audições (competindo com uma “velha” Ingrid).; a “autoralidade de se fazer um filme com um pessoal de Recife”; a nova novela “amazona futurista”; o motorista (o ator Mário Gomes). “Você é atriz de cinema? Pô, achei que tivesse feito cinema. Comédia nacional? Quem vê esta bosta?”, diz-se entre maconha e Cidade Negra, em um misterioso Thriller road-movie a procura investigativa de “Makowski abrasileirado”, passando por pessoas-tipos paulistas e tomadas aéreas de São Paulo.

“Qual o sentido disso tudo”, pergunta. E aos poucos redescobre a felicidade nas “pequenas coisas”, como cantar Claudinho e Bochecha no karaokê; a ira enlouquecida de um fã maluco, obcecado e carente (que só quer ter amigos); o sarcasmo rebatido que vem com química entre o casal recém apaixonado e com casamento “foda-se”, que terão “netos horrorosos e pobres”; o clipe final ultra mega surtado; e a música que traduz momentos da “voz da América”.

“TOC: Transtornada, Obsessiva e Compulsiva” é despirocado, desbocado, sarcástico, debochado, surtado, desengonçado, livre, hilário, despretensioso, transtornado, obsessivo, compulsivo, um “filme com macaco” e insanamente engraçado, por conjugar entretenimento com conteúdo e sem esquecer dos momentos potencializados à caricatura paspalhão. Trocando em miúdos, é obrigatório e vale à pena assistir.

4 Nota do Crítico 5 1

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