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Crítica: Dunkirk

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A Ilusão da Guerra

Por Fabricio Duque


O Cinema é uma arte extremamente subjetiva, e na maioria dos casos, altamente passional. Tornando-se a máxima do “ame ou odeie”. Cada um pulula suas elucubrações sobre os filmes baseando-se em seus gostos e costumes visuais. É fato que a arte cinematográfica necessita-se da imagem como seu material bruto. O que se vemos na tela é a verdadeira experiência. Então como explicar o experimento do cineasta inglês Derek Jarman em “Blue” (em que só ouvimos a história por uma tela azul do início ao fim)? Alfred Hitchcock dizia que cinema é uma experiência única e exclusivamente visual. Já Manoel de Oliveira acreditava que o conceito narrativo era o mais importante e que quanto menos artifícios ilusórios, melhor.

O mais recente filme do diretor inglês Christopher Nolan (de “A Origem”, “Amnésia”, “Batman: O Cavaleiro das Trevas”), “Dunkirk”, sobre a Operação Dínamo, uma operação militar da Segunda Guerra Mundial arquitetado pelo Primeiro Ministro inglês Winston Churchill (retratado recentemente no seriado “The Crown”) em que quase trezentos e quarenta mil soldados aliados foram evacuados sob intenso bombardeio, entre 26 de maio e 4 de junho, da cidade francesa de Dunkirk até a cidade inglesa de Dover.

Aqui o filme em questão é uma experiência pontual e objetivamente visual (que urge pela tecnologia IMAX). Uma orgia aos olhos do espectador. Uma tensão permeada e cultivada ao longo da trama, que é potencializada pela trilha-sonora marcante que nos conduz aos limites das personagens. Tudo é majestoso, imponente, sinestésico, hiperbólico, tanto que parecemos estar em combate, durante a guerra, lutando pela sobrevivência de nossas próprias vidas. É sensorial, aflitivo e até mesmo físico por causar vertigem, observada por câmeras subjetivas que vez ou outra chega a tremer a própria imagem. É praticamente um “O Filho de Saul”, do húngaro László Nemes.

Soldados aliados da Bélgica, do Império Britânico e da França são rodeados pelo exército alemão e devem ser resgatados durante uma intensa batalha no início da Segunda Guerra Mundial. A história acompanha três momentos distintos: uma hora de confronto no céu (à moda “Top Gun – Ases Indomáveis”, de Tony Scott), em que o piloto Farrier (o ator Tom Hardy, de “Mad Max – A Estrada da Fúria”) precisa destruir um avião inimigo; um dia inteiro em alto mar, em que o civil britânico Dawson (o ator Mark Rylance, de “Ponte dos Espiões”) leva seu barco de passeio para ajudar a resgatar o exército de seu país; e uma semana na praia, em que o jovem soldado Tommy (o ator Fionn Whitehead da minissérie “Him”) busca em qualquer oportunidade uma chance de sobreviver e retornar a seu país. É a epopeia de vidas que se agarram por terra, mar e ar a qualquer esperança e perspectiva para não virarem estatísticas de guerra.

“Dunkirk” questiona sobre o propósito da guerra, sobre pessoas-soldados “Highlanders” como figurantes abandonados e sobre o sentimento de fracasso de “abandonar” o fronte e mesmo assim ter a heróica condecoração, deturpando o próprio orgulho e esquecendo a decepção da perda com a convicção do discurso de Churchill. Aqui é reverberada a máxima popular do “farinha pouca, meu pirão primeiro”. Eles até tentam investir sua solidariedade do ajudar, mas o individualismo auto-protetor “grita” catarticamente mais alto. “Sobrevivência não é justa”, diz.

Como foi dito, cinema é ilusão. Seus ataques aéreos, seus tiros, suas bombas. Tudo é ambientado em sua versão mais pura: a manipulação de nosso olhar. De prender nossa atenção. Não há silêncios e muito menos respiros. Em uma edição ultra rápida, o longa-metragem busca manter o equilíbrio narrativo, mas escorrega na exacerbação do próprio conceito, tendo que recorrer a gatilhos comuns hollywoodianos para explicar, como as conversas secretas e próximas ao personagem principal que está escondido. Suas interpretações quebram o ritmo com um urgente anti-naturalismo, beirando o sentimental e o melodrama, com suas frases de efeito e suas “neuroses da guerra”, como “Ele nunca será mais o mesmo”. Suas ações (resoluções e reações) soam desengonçadas, óbvias, impulsivas e desesperadas como a briga no iate “salvador”, exacerbadas pela música que obriga o contato com nossa emoção mais primitiva e infantil. “Para pegar sobreviventes, temos que sobreviver”, diz.

“Dunkirk” é uma experiência poético-realista de guerra, utilizando-se da mais moderna tecnologia para imergir o público, como o balé bélico. “Ver nossa casa não ajuda chegar a ela”, diz. Mas chega uma hora que seu cérebro é desligado pela constância da interatividade visual. Não é ruim. Pelo contrário, é uma aula de cinema. Só que esquece de condensar e mesclar outros elementos necessários. Definitivamente, se lembrarmos das primeiras cenas de “O Resgate do Soldado Ryan”, de Steven Spielberg, aqui é um filme único e recomendado.

3 Nota do Crítico 5 1

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