A Chegada

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A surpresa que não chega ao espectador

Por Fabricio Duque

A justificativa do Festival do Rio para abrir a edição 2016 com “A Chegada”, que aconteceu na Cidade das Artes, na Barra da Tijuca, do Rio de Janeiro, foi a de “celebrar a carreira do grande diretor Denis Villeneuve desde “Incêndios” que explodiu para o mundo”. E em uma saudação em tela, visto que não pode estar presente por já estar preparando o próximo filme, o cineasta canadense de “Sicario: terra de ninguém”, “Os suspeitos”, americanizado a cada dia, disse que “sonhava fazer ficção científica há séculos”. “Esta é um história sobre linguagem”, complementou. O longa-metragem tinha o título “Story Of Your Life” (por ser baseado no conto homônimo de 1999, de Ted Chiang), mas que foi modificado por causa da rejeição de seu público.

“A Chegada”, que está indicado ao Oscar 2017 em oito categorias (Melhor Filme, Melhor Diretor, Melhor Roteiro Adaptado, Melhor Fotografia, Melhor Edição, Melhor Design de Produção, Melhor Edição de Som e Melhor Mixagem de Som), é acima de tudo um filme sobre não esquecer e sobre a arte de se comunicar. Com narração pessoal de lembranças fragmentadas em elipses que vão e vem (dando de forma homeopática peças para montar o quebra-cabeças dos estágios da filha da personagem à morte), fotografia névoa que ambiente desesperançoso – e etéreo à moda de Terrence Malick e seu “Árvore da Vida” – de melancolia resignado (a espera do fim), e música sentimental que define o tom narrativo. “Memória é algo estranho. Estamos presos ao tempo e à ordem”, diz-se.

Quando doze misteriosas naves espaciais aterrissam em todo o mundo, uma equipe de elite, liderada pela linguista Louise Banks (a atriz queridinha do momento Amy Adams, que também integra o elenco de “Animais Noturnos”, de Tom Ford), é reunida para investigar. Enquanto a humanidade hesita à beira de uma guerra mundial, Banks e sua equipe (Jeremy Renner como co-seguidor) correm contra o tempo em busca de respostas – e para encontrá-las, ela terá de se arriscar pondo em perigo a própria vida e, muito possivelmente, a do resto da humanidade. Ela, que também é professora da língua portuguesa, “não acredita em começos e fins”. Ambos são pressionados a descobrir o propósito dos extraterrestres (de ameaça ou não), assim como outras onze equipes de países onde as naves pousaram. Porém, os interesses políticos, a corrida pela supremacia, o medo do desconhecido e as diferenças culturais entrarão no caminho da ciência.

“A Chegada” é uma viagem metafísica existencialista. O que acontece talvez não seja a realidade e sim uma projeção depressiva, desanimada e terminal da mente da protagonista, que se refugia na fantasia a fim de proteger culpas, sofrimentos, desesperos individualistas e a solidão pós-choque. O filme começa logo. Sem muitas apresentações. Direto ao ponto. O Mundo, em estado de emergência enlouquece com a iminência apocalíptica. As televisões saem do ar. Líderes internacionais de vários países perdem-se nas faltas dos próprios conhecimentos sobre o assunto tão improvável. A humanidade precisa aprender a ser social. A China “sempre” na defensiva. Não há lógica nos “procedimentos extraterrestres” e nas “grafias não lineares”. “Impressione com os fundamentos”, diz-se.

O filme, em um indefinível gênero, quase em um limbo por não saber ser independente ou comercial, pulula interpretações imediatistas; gatilhos comuns de suspense que não dá susto e de resolução rápida demais; aceleração na cadência abordada; e ações clichês (de regras “overreacting” desesperadas, apressadas, exageradas e de efeito forçado), como uma caricatura já conhecida e massificada pelos estúdios de Hollywood (mas com efeitos especiais de um exemplar d Filme B – talvez uma homenagem ao cineasta Mario Bava, quem sabe). Mas nem tudo está perdido. É inevitável não referenciarmos os ruídos de “2001 – Uma Odisseia no Espaço”, de Stanley Kubrick pela epifania que confunde sonho e realidade.

“A Chegada” desperta diversas inferências. É sem sombras de dúvida um filme sobre imigração, de um novo povo que chega em um universo estranho, incompreensível e que precisa ensinar / aprender a língua nativa com o intuito básico de se comunicar e explicar o motivo pelo qual estão visitando. O tema está em voga pela nova plataforma do presidente americano Donald Trump em “proteger radicalmente” os Estados Unidos da “chegada” de outros não originários. Aqui, a premissa de seu conteúdo é mais importante que a forma propriamente dita, esta que se conduz por uma técnica amadora, didática, fácil, superficial, previsível, até mesmo boba. “Lutamos pelos alienígenas inteligentes”, diz-se, sob a ótica da exceção da aceitação do outro ainda “não próximo” em que americanos são “pacíficos” e os outros “palhaços”.

E no final, a surpresa objetivada e revelada de “A Chegada” não surte efeito, soando muito mais desengonçando, paranormal, óbvio e nacionalista em excesso que uma reviravolta promissora. Exibido nos festivais de Veneza e Toronto 2016.

2 Nota do Crítico 5 1

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