O que cria a permanência e o desejo da volta?
Por Fabricio Duque
Talvez o elemento que mais desperte a arte de escrever seja o sentir, vivenciando o momento como se fosse uma catarse técnica. Por isso, admiro quem consegue traçar linhas urgentes e apressadas sobre as críticas cinematográficas. Aqui não é bem assim, e descamba a uma sucessão de esperas e procrastinações. O documentário “Caminho de Volta”, de José Joffily (do icônico “Quem Matou Pixote?”, e que já trabalhou o tema na ficção “Dois Perdidos Em Uma Noite Suja”), e de Pedro Rossi, é um deles, pois aborda o “retorno” à terra natal (o Brasil) de pessoas “imigrantes” que escolheram cidades estrangeiras para morar, apesar de todas as dificuldades e percalços do caminho, pela vida pessoal de André Câmara, um fotógrafo de 45 anos, de Londres e Maria do Socorro, 87 anos, de New York, que têm uma coisa em comum: ambos deixaram o Brasil para morar no exterior. O documentário relata a tentativa deles em fazer o caminho de volta para o Brasil, lidando com todas as incertezas e as diferenças ao retornarem. É um longa-metragem que mexe principalmente a quem não se “sente” brasileiro, e que acima de tudo imprime toda a coragem, expulsando qualquer resquício de covardia. É estranho para mim escrever sobre este filme, porque sempre que “retorno” de New York (a cidade que é definitivamente minha primeira escolha de moradia), sinto como se um vazio fosse instalado em meu ser. É confuso e terapêutico. Um por voltar, o outro por ter descoberto meu lugar. Não há como não referenciar “Laura”, de Fellipe Barbosa, pelo lado idiossincrático e in loco dos “personagens” reais. Cada um luta por um sonho, por uma chance. Sei disso principalmente quando converso com amigos que estão “lá fora”. Muitos “largaram” tudo e foram. Talvez por isso tenha demorado demasiado tempo para traçar linhas sobre este tema. Talvez por despertar a vontade, de confrontar o querer impeditivo de estar aqui e desejar o lá. Bem, quanto à narrativa, “Caminho de Volta” intercala os “atores”, os deixando livre em seus pensamentos, tentando assim personificá-los em tela, com suas consequências, sentimentos, liberdades, limitações (como a senhora que mora há mais de vinte e quatro anos – com o objetivo de “servir” e “ajudar” seu filho – e ainda não fala totalmente o inglês. Como sobrevive? Como é morar em um canto em um apartamento por tanto tempo? O que estimula? O que cria a permanência?). As perguntas retóricas já se auto-intitulam. São retóricas e subjetivas para cada espectador respondê-las de acordo com suas vivências, medos, decisões e percepções. “Caminho de Volta” é um documentário poético, livre, intimista, quase um exemplo de Chantal Akerman, e um que de “Santiago”, dos irmãos Salles, mas com toque nostálgico-encenado de José Joffily. “Não queríamos ninguém exótico, tinham que ser pessoas com quem o público pudesse se identificar, com problemas comuns. Esta foi a reflexão do filme: a impossibilidade de voltar.”, finalizam os diretores. Recomendado.
4
Nota do Crítico
5
1