O filme venceu na categoria de Melhor Roteiro Adaptado (David França Mendes) no Grande Prêmio do Cinema Brasileiro 2013.
Ficha Técnica
Direção: Vicente Amorim
Roteiro: David França Mendes
Elenco: Tsuyoshi Ihara, Takako Tokiwa, Eiji Okuda, Shun Sugata, Kimiko Yo, Eduardo Moscovis, Celine Miyuki, Issamu Yazaki
Fotografia: Rodrigo Monte
Distribuidora: Downtown Filmes, RioFilme
Estúdio: Globo Filmes / Mixer / Downtown
Classificação: 14 anos
Duração: 115 minutos
País: Brasil
Ano: 2010
A Honra do Império Japonês
“Corações Sujos”, baseado no livro homônimo de Fernando Morais, autor consagrado por “Chatô”, apresenta-se como o novo filme do diretor Vicente Amorim (de “Caminhando nas Nuvens”). Inicio-me aqui pela coletiva de imprensa que aconteceu dias antes do lançamento nos cinemas, direcionando a opinião a partir do que foi dito pelo próprio diretor: “É um filme comovente, que toca as pessoas”. Concordo que a sentimentalidade é explícita no filme. O que não entendo é a sua exacerbação. O longa-metragem comporta-se como dois filmes em um. A primeira parte é contada de maneira naturalista, equilibrada e afiada. Já a outra sequência (próxima ao final), da cena em que a esposa do protagonista o encontra na casa, após o trágico acontecimento produzido, direciona outro caminho, imprimindo constantes elementos dramáticos, beirando ao clichê e ao gatilho comum. Não entendo como a genialidade de um possa ter gerado outro quase patético. O filme acontece por causa dos atores, principalmente japoneses, que estão conectados e receptivos, tanto que Tsuyoshi Ihara ganhou o prêmio de melhor ator no Festival Internacional de Cine de Punta del Este, Uruguai. Quanto à barreira da língua, a mesa da coletiva de imprensa, que incluía o ator Eduardo Moscovis e o roteirista David França Mendes, explicou que não foi fácil, e forneceram uma curiosidade. No Japão, o diretor não diz “gravando”. Fechar a claquete já indica o sinal de início da cena. Há no filme imagens desfocadas e esteticamente desajustadas, como uma visão distorcida, que, traduzidas por Vicente, querem dizer uma linguagem poética que intensificam a loucura dos personagens. Podendo ser entendida de maneira metafórica à crença vivenciada na história.
O tratado de rendição assinado pelo imperador japonês Hirohito ao general americano Douglas MacArthur marcou o fim da Segunda Guerra Mundial. Entretanto, no Brasil o anúncio não marcou o fim do período de violência. Os imigrantes japoneses que viviam no interior do estado de São Paulo, formando a maior colônia do país fora do Japão, se dividiram em dois grupos. Os que acreditavam na notícia eram chamados de traidores da pátria, apelidados de “corações sujos”, e perseguidos por aqueles que endeusavam o imperador e ainda acreditavam na vitória do Japão. É neste contexto que vive Takahashi (Tsuyoshi Ihara), dono de uma pequena loja de fotografia e casado com Miyuki (Takako Tokiwa), uma professora primária. Incitado pelo coronel Watanabe (Eiji Okuda), ele se torna o vingador daqueles que pregam a supremacia japonesa e passa a atacar todos aqueles que não acreditam que o país foi derrotado na guerra.
É um filme de baixo orçamento, custeado com mais ou menos sete milhões e quatrocentos mil reais, e transpassa, despretensiosamente, o livro de Fernando ao cinema. A filosofia abordada é propositalmente utópica, ao creditar aos japoneses a possível vitória da guerra, impulsionando um nacionalismo crônico ao país de origem. O roteiro expõe que apenas uma ação mal conduzida (por ego e por poder) desencadeia uma sucessão de tragédias e afins, culminando em uma guerra, que poderia ser evitada. Os valores da ética, da honra, da palavra, da liberdade, da nacionalidade, desaparecidos hoje em dia, são elevados à quinta potência pelos indivíduos japoneses, que “participam” do meio político brasileiro. O longa está mais atual do que nunca, questionando ideias e induções, que manipulam a realidade pela necessidade da alienação alheia. O meio influencia porque obriga, aos concidadãos, de forma recorrente, a aceitar opiniões prontas e únicas. Vale à pena assistir. Recomendo.
Trecho do site “Adoro Cinema”. Fernando Morais escreveu o livro em 2000. A vontade de pesquisar mais sobre a história relatada em “Corações Sujos” surgiu anos antes, quando o autor entrevistava uma jovem nissei durante as pesquisas para o livro “Chatô, o Rei do Brasil”. Durante a conversa, a jovem citou que seu pai fazia parte de uma “seita nipônica”, mas depois desconversou. Isso foi o suficiente para deixar Fernando Moriais instigado. Em 2001 Corações Sujos recebeu o Prêmio Jabuti de Livro do Ano de Não-Ficção. Estreia da menina Celine Fukumoto, de apenas 10 anos, no cinema. Mesmo sem nenhuma experiência prévia ela superou centenas de candidatas e consegui o papel de Akemi, filha de Naomi e Sasaki. Nascida no Brasil e neta de japoneses, Celine ainda não fala o idioma japonês com fluência, mas não teve dificuldades para decorar as falas. Quando a menina tinha alguma dificuldade, recorria à Tsuyoshi Ihara, o protagonista do filme, ou à Kimiko Yo que interpreta sua mãe.
O Diretor
Vicente Amorim é diretor de cinema, TV e publicidade, começou a carreira como assistente de direção de nomes como Paul Mazurky e Hector Babenco. Nascido em Viena, Áustria, em 1966, estudou Economia na UFRJ e Cinema na UFF. Na Rede Globo foi um dos diretores do seriado A justiceira. Seu primeiro longa-metragem, lançado em 2001, foi o documentário 2000 Nordestes, codirigido com David França Mendes – melhor documentário no Festival de Cinema Brasileiro de Miami e primeiro filme brasileiro a receber o selo da Unesco por seu conteúdo. Em 2008, realizou o longa de ficção Um homem bom, com Viggo Mortensen, filme considerado pela revista The Hollywood Reporter como um dos 10 melhores filmes do ano.
Filmografia
Corações sujos (2012)
Um homem bom (Good/ 2008), com Viggo Mortensen.
O caminho das nuvens (2003)
2000 Nordestes (2001). Codirigido com David França Mendes. Prêmio de melhor documentário no Festival de Cinema Brasileiro de Miami. Primeiro filme brasileiro a receber o selo da Unesco por seu conteúdo.
Não fique pilhado (2000). Curta-metragem.
Vaidade! (1990). Codirigido por David França Neves. Curta-metragem. Prêmio de melhor direção no Festival de Gramado.
Fotos da Coletiva de Imprensa