“Mamata” e “Construindo Pontes” no Festival de Brasília 2017
Transcrito por Fabricio Duque
Coletivas de imprensa têm o poder de serem polêmicas (como a de “Vazante”) ou “tediosas”, segundo Luiz Zanin, e extremamente divertidas, como a de hoje, mais por conta do curta-metragem “Mamata”, de Marcus Curvelo (do Coletivo de cinema Cual), do que de “Construindo Pontes”, de Heloísa Passos, este um confronto político de sua relação com seu pai.
É engraçado porque a mediadora Maria do Rosário disse que achou que o diretor de “Mamata” estivesse atrasado porque teria tomado a “pedalada” (entendedores entenderão – aos que viram, logicamente). E sobre a diretora Heloísa que não “organiza a vida desorganizada” e diz inocente sobre Helô ainda estar casada com Tina. “Era outro amor da minha vida. Era outra gata”, rebate com humor a diretora. Todos riem. “Não é mais a Tina agora”.
MAMATA
Marcus: “Só queria dar alegria para o meu povo. O filme seria só por causa da pedalada depois de ter perdido a prova. As coisas foram ficaram mais esquisitas e piores. Antes de ser artista, brasileiro, não conseguia pensar em nada que não fosse nisso. Tinha memórias afetivas como a morte do Senna, um herói brasileiro. Buscava onde o filme encontrava a chave: o cômico e o trágico, como o grito da personagem Joder de “Fora Temer” no vazio. Rir também tem uma potência. Rir o desespero. Vanusa é uma homenagem. Joder é meu Grande Lebowski. Eu tinha minha cara demais no filme. Aí coloquei imagens de Brasília. Estava preocupado em chegar à ironia certa. Era um risco. Claramente é uma referência a Trapalhões, a Essa Aranha, Brasil 2000, Edgar Navarro, Memórias de um Desenvolvimento, O Bandido da Luz Vermelha. A cambalhota da rampa foi ao Vampeta. É um filme mais marginal, mais radical. Mais pulsão, mais catarse, mais loucura. E não ficar só na melancolia. Uma sensação de desespero, de riso. Essas gags já estavam presentes”.”Até que ponto é você, até que ponto é criação, construção. Ou era esse risco ou não teria filme”. Tem a briga no coletivo de que querer que o Joder dê certo. Mas a gente gosta de tragédia. A chave da comédia. Auto-consciência. Cadência do momento do humor”.
CONSTRUINDO PONTES
Heloísa ou Helô: “Tem “Diário de uma Buca”e “Os Dias com ele”. Filmes que me deram coragem. Cada processo é uma invenção, muito particular. Mais ou menos oitenta horas filmadas. Foram etapas de reflexão. Fazer cinema é possibilidade de encontro. Ver e ouvir. O dos outros. O desejo de ouvir um homem que pensa diferente de mim. Deste lugar que desapareceu versus esse assunto que me inquieta. O processo começa na pesquisa em 2010. Camisetas Adeus Sete Quedas. Tenho uma memória realmente com esse lugar. Me re-conecto com essa perda quando vejo essas imagens em Super8. Processo de abrir câmera é um processo difícil na casa do meu pai. Parti de um desejo de converso não buscando o confronto. De uma pessoa que eu tenho tanta intimidade. Era o volta de nossas conversas. O confronto veio naturalmente. Meu pai me deu o final. No beira do Rio não aconteceu nenhuma epifania. E na estrada de ferro que ele construiu aconteceu o final”
“Eu descobri que não sou uma grande atriz e que meu pai é um grande ator, dentro dessa complexidade. Essa calma dele me tira do sério. Os dois personagens são diferentes. Eu me altero. Calma com duas câmeras que eu montei na casa dele. Um jogo na aventura de viver. Uma exposição muito grande”
“Estudei posições de câmera, mas fazer cinema é estar aberto. Ele esquece que a câmera está lá. Ele está mais preocupado em ajudar os jogos que a Helô quer. Ele estava muito à vontade com as câmeras. Lembrar que tem que esperar ligar a câmera’.
“A gente não esperava o trem. O filme é atravessado pela vida. Construções das ações. Não desistir e continuar. Não desistir foi a disponibilidade deste pai. Um maior demonstração de amor da vida”.
A irmã intervém: “Não houve ensaio”. E crítico Filippo Pitanga disse: “Filhos gritam para se libertar dos pais, do silêncio opressor que dá raiva”. O pai “ganha o filme, na argumentação o espectador e dá o final”. A questão do pai ser muito inteligente não facilita a vida dos filhos. Metáfora da sincronicidade. É uma coisa geracional. Relativizar o discurso. Ambiguidade que estamos perdendo no próprio cinema.
Helô: “Eu não frequentei escolas aonde o diálogo existia. Descobrir esse diálogo saindo de casa porque naquela época não dava chance ao diálogo. Defensiva minha por sentir a opressão. Existe um limite meu. Como diretora. Como filha. Como personagem”.
“Nascemos na ditadura com pais que vinham da ditadura. Mostra e revela um Brasil a partir de uma micro-ação que é difícil dialogar. De quanto a democracia passa pelo afeto. É muito duro. Muito rude”.
“A presença física da Tina não é periférica. Meu foco tava na relação com meu pai, que envolve várias coisas como nosso casamento (com a Tina, no momento), de que ela está no cotidiano da família”.
Tina: “Eu me sinto da família. Aceito por todo mundo”. ”Ela está lá boa parte do tempo, mas fora do campo”.
Sobre a sequência dos créditos com fotos de família e música de Belchior
Helô: “Eu descobri que meu pai é extremamente cativante na edição. O cinema me autoriza a descobrir coisas quando estou filmando. Créditos realmente é uma sequência com uma força emocional muito grande com mais potência da música no final. Você tem que pensar no fim, Heloísa. Só consegui colocar câmera em 2016. Eu não tenho a resposta do que é o filme. Se eu não fizer o filme eu não vou saber o que era o filme. Insistia na pergunta com medo do filme ficar chato”.