Beetlejuice – Os Fantasmas Se Divertem
Diversão no outro mundo de Tim Burton
Por Fabricio Duque
O mundo era outro e completamente diferente no final dos anos oitenta do século passado. Parecia até ficcional aos olhos de hoje. Naquele tempo, o comportamento social parecia ter uma liberdade mais orgânica, sem a necessidade de tantas projeções do ser. Parecia também que as questões universais eram mais simples e mais traduzíveis, especialmente pela felicidade das pequenas coisas e momentos, que se bastava por si só. E a arte seguia essas ideias ao permitir inovações de linguagens e um maior respeito às idiossincrasias criativas de seus artistas, que podiam expressar todas as estranhezas presentes em suas personalidades. E lógico que o cinema acompanhou essa evolução, até porque a sétima arte representa em sua essência ser um reflexo da realidade e de tudo o que acontece em redor na época em que estamos existindo.
Um desses artistas é o cineasta Tim Burton, que conseguiu, logo nas primeiras obras, conduzir a estranheza narrativa em inúmeros e coloquiais elementos integrados: o surrealismo, o bizarro, o gótico, a atmosfera maldita de Edgar Allan Poe, esta de combinação harmonizada à “Família Addams” e à “Rock Horror Picture Show”. É, pois é, escrever essas linhas analíticas estando em 2024 chega a ser um choque de gerações, conflitante e desanimador. Em “Beetlejuice – Os Fantasmas Se Divertem”, de 1988, filme em questão aqui, Tim Burton constrói a estética de uma época, que não tinha vergonha alguma de ser ridícula e que não se importava de forma alguma nos resultados da criação. Havia até mesmo um amadorismo aceitável e cúmplice por parte do publico, talvez por não saber das evoluções técnicas do futuro. O espectador era menos exigente, mais ingênuo, de querer humilde e ávido por novidades. Assim, o filme se bastava na própria história e não precisava se preocupar com tantos detalhes de experiências visuais. O humor era mais libertário, mais perspicaz e menos policiado. Até as ofensas eram menos sensíveis e rebatidas na contracena.
Ainda que “Beetlejuice – Os Fantasmas Se Divertem” se apresente pela linha do mais popular, de se comportar mais direcionado à audiência, ainda assim todo o roteiro busca respeitar a inteligência do espectador, sem explicar referências, como o mundo paralelo de Salvador Dalí, cujo surrealismo é apenas inserido, e não necessita de didatismos de tradução. Pois é, confesso que é muito difícil categorizar isso tudo que foi feito nos anos oitenta. As cores, as músicas, o sarcasmo popular, o humor mais ficcionalmente natural e referenciado com o que acontecia no mundo naquele momento, tudo era um pacote que recebíamos. Aqui, outra tendência abordada no filme é a alimentação da figura da celebridade, atores advindos de outros sucessos do cinema, como Jeffrey Jones, que foi trazido após seu papel no clássico “Curtindo a Vida Adoidado”, de 1986; Catherine O’Hara, que veio de “Depois de Horas”, de Martin Scorsese, e depois participou do sucesso “Esqueceram de Mim”. Michael Keaton após interpretar o protagonista aqui ganhou o papel principal em “Batman”, de 1989. E talvez as “caras e bocas” devem ter influenciado o filme “O Máscara”, com Jim Carrey, em 1994.
Sim, “Beetlejuice – Os Fantasmas Se Divertem” trazia muitas limitações criativas. Todo o desenho gráfico não possuía recursos financeiros e tampouco modernos maquinários de efeitos especiais como se têm hoje. A solução de Tim Burton foi aceitar e transformar todo esse amadorismo em viagem-conceito estético, cuja ideia se desenvolvia pela forma proposital caseira da criação, e bem aliada às neuroses existencialistas e mórbidas de suas personagens em cena, permitidas pela verve subjetiva, e de novo espelhos dos comportamentos da realidade. Como a fumaça da obra que cria a sátira aos filmes de terror. E/ou o mundo fantasia de “Alice no País das Maravilhas”. O cineasta gerou a sua alcunha de cinema de gênero, em que a mise-en-scène acontecia pelo tom irreal, de sonho acordado, vívido e sonâmbulo, de realismo fantástico, especialmente no uso das cores mais fortes, mais estilizadas ao contraste, como por exemplo o carro amarelo, o verde da cadeira, o branco da casa. Beetlejuice, um “fantasma incrementado” que bebe “suco de besouro”, “ilegal”, é um ser tarado, asqueroso, machista, que busca sobreviver na pilantragem e que possui métodos não convencionais para “salvar os outros”. Dizer seu nome três vezes é por sua conta e risco.
“Beetlejuice – Os Fantasmas Se Divertem” tem humor absurdo e exagerado, acrescido de números musicais “possuídos” de “Calypso”, que chega a soar uma apresentação circense. Como eu disse, a geração oitentista não tinha medo do ridículo e da entrega “despirocada” em seus papéis, conflitantes entre a crítica ao comportamento superficial dos ricos e verdade sobrevivente das classes menos favorecidas. Talvez seja isso o elemento chave que consegue traduzir toda uma época e toda a força narrativa de coloquialismo popular, entre piadas datadas e surtos criativos, que dava o ingrediente para equilibrar todo o desenvolvimento da obra.
1 Comentário para "Beetlejuice – Os Fantasmas Se Divertem"
Tim Burton foi e ainda é um grande escritor, tem muitos livros publicados pelo mundo afora, em “Beetlejuice- Os Fantasmas Se Divertem”, Ele cria uma critica ao sua sociedade da sua época uma critica saudável, mais o ironias.