As Rainhas da Torcida
Não fede nem cheira
Por Pedro Guedes
Às vezes, é difícil começar a escrever sobre um filme como “As Rainhas da Torcida”. Não que seja uma obra complexa, que lida com temas que precisariam ser discutidos através de uma longa e criteriosa análise. Na verdade, o que complica a tarefa de comentar um trabalho como este é justamente o fato de ele ser tão simples, genérico e esquecível – e entendam: não é nem um filme ruim, apenas… simplório demais para deixar uma “marca” na memória do espectador. O que estou querendo dizer, em bom português, é que “As Rainhas da Torcida” não fede nem cheira. Sentiram a minha dificuldade ao escrever este primeiro parágrafo?
Escrito pela dupla de estreantes Zara Hayes e Shane Atkinson, o roteiro gira em torno de Martha, uma senhora que chegou à terceira idade e sente-se desmotivada, como se não tivesse vivido o suficiente. Temendo que a morte possa vir a qualquer momento (afinal, não há nada mais efêmero do que a vida), ela decide chamar sua amiga Sheryl para ajudá-la a realizar alguns sonhos que haviam sido largados no meio do caminho – o maior deles consiste em criar nada menos do que uma equipe de líderes de torcida. Assim, Martha e Sheryl conseguem reunir um grupo pequeno de senhoras que resolvem embarcar nesta jornada, porém não demora até que alguns obstáculos comecem a aparecer no caminho das cheerleaders: algumas delas apresentam limitações físicas trazidas pela idade e, para piorar, praticamente todas as pessoas ao redor das senhorinhas encara como ridícula a ideia de uma equipe de torcida septuagenária, submetendo Martha, Sheryl e companhia a uma humilhação pública e constante.
Estabelecendo-se como um “primo” do divertidinho “Do Jeito Que Elas Querem” (também estrelado por Diane Keaton, diga-se de passagem), “As Rainhas da Torcida” é um filme cujo público-alvo consiste basicamente em mulheres que chegaram à terceira idade, estimulando estas a continuarem vivendo sem que tenham que abandonar os costumes da juventude. O que Hayes e Atkinson querem dizer, portanto, é que não existe idade para nada – e, neste sentido, a mensagem da obra não poderia ser mais admirável: é natural que as pessoas sintam crises e enfrentem cada vez mais dificuldades quando chegam a determinadas idades, mas isso não quer dizer que a rotina e a vontade de viver devam diminuir. E mais do que isso: não interessa se os outros acreditam que você deveria estar internado(a) ou sob cuidados de… sei lá quem; a única pessoa que deve decidir seus objetivos é você. (Uau, que bela frase motivacional, hein?)
Sim, as intenções de “As Rainhas da Torcida” são louváveis – e não duvido que o filme faça um bom trabalho em se comunicar com seu público-alvo. O problema, no entanto, é que a maneira como a obra desenvolve seus temas se resume a clichês, clichês e mais clichês, limitando-se ao lugar-comum das comédias genéricas que a “Sessão da Tarde” vive exibindo hoje em dia. Percebam, por exemplo, como a própria decisão de Martha em criar uma equipe de líderes de torcida é estabelecida de uma hora para a outra: num momento, a protagonista está relembrando seu passado, porém ainda tratando-o como algo que jamais retornará; na cena seguinte, ela já mudou de ideia e está pronta para montar um grupo.
Além disso, as frequentes tentativas de humor mostram-se incapazes de criar algo minimamente inspirado, culminando em uma sequência interminável de piadinhas previsíveis, tolas e sem graça – muitas delas, inclusive, ridicularizando as próprias condições físicas das protagonistas, o que põe em cheque as intenções do projeto como um todo (ora, se o filme quer celebrar a terceira idade, por que perder tempo com piadinhas que riem da cara da terceira idade?). Para piorar, os momentos dramáticos soam igualmente esquemáticos e ineficazes, sendo surpreendente, inclusive, que o terceiro ato tente criar um sentimento de urgência em torno da saúde de Martha, mas nunca consiga fazer o espectador acreditar de fato nos problemas enfrentados pela personagem (e quando as consequências chegam, o roteiro faz questão de ignorá-las covardemente).
Dirigido pela estreante Zara Hayes, que apenas segue uma listinha básica de pré-requisitos de qualquer comédia genérica da “Sessão da Tarde” (planos que mostram as reações de certos personagens diante de uma situação constrangedora; uma musiquinha animada num momento mais entusiasmado; um clímax no qual as protagonistas terão que se apresentar para uma plateia desconfiada; etc), “As Rainhas da Torcida” traz Diane Keaton numa performance razoavelmente carismática, porém acomodada no mesmo tipo de composição que a atriz já vem realizando em praticamente todos os seus últimos trabalhos. Já Jacki Weaver fica presa a uma personagem que nada mais é do que uma metralhadora de piadinhas irritantes e desesperadas, ao passo que o resto do elenco é desperdiçado de maneira lamentável (Pam Grier, em especial, é relegada a uma participação quase insignificante).
Aliás, uma das melhores piadas do filme gira em torno da personagem de Rhea Perlman. Não vou dizer o que acontece, mas basta dizer que é um dos raros momentos onde “As Rainhas da Torcida” exibe alguma imaginação. Na maior parte do tempo, porém, é uma obra esquecível, formalmente medíocre e que, mesmo durando ligeiros 90 minutos, parece muito mais longa do que realmente é.