Ad Astra – Rumo às Estrelas
Monolito não encontrado!
Por Fabricio Duque
Exibido na mostra competitiva do Festival de Veneza 2019, “Ad Astra – Rumo às Estrelas” é o filme mais recente de James Gray (“Era uma Vez em New York”, “Z: Cidade Perdida”), um diretor que ganhou reconhecimento cult internacional por traduzir o melodrama dos temas universais pela utilização de um tempo narrativo entre a epifania e o comercial, conservando literalmente as características hollywoodianas: a de não fugir da padronização aceitável (como a escalação-protagonismo do ator Brad Pitt). É um retrato comportamental do povo americano, que mantém sua essência pautada na sensibilidade aguçada, óbvia, protocolar e de publicar representantes em ícones.
“Ad Astra – Rumo às Estrelas” é uma ficção científica que questiona a crítica sobre a robotização do ser humano (“treinado para separar as coisas”, quase um “Robocop”). Sobre um mundo que não se pode mais sentir, tampouco reagir. Que “avaliações psicológicas” precisam ser aprovadas (monitoração constante e incessante). Sobre a institucionalização da solidão. Sobre a “domesticação” das viagens espaciais, em que o serviço de bordo (“cobertor e travesseiro”) custa “cento e vinte e cinco dólares”. É sobre o falso progresso contra a rebeldia do pensar diferente. Sobre um futuro com a cara do jeitinho do presente com “cautela redobrada”. Sobre a busca da esperança em novas formas de inteligência.
O longa-metragem, produzido pelo brasileiro Rodrigo Teixeira (de “Me Chame Pelo Seu Nome”) desenvolve sua narrativa pela tom sensorial, por uma ambiência etérea de separar e suspender o tempo e o espaço (em imagens deslocadas e em fusões, quase ectoplasmas), e assim, inevitavelmente, remete a trilogia fímica de cenário cósmico: “Stalker”, de Andrei Tarkovski; “2001 – Uma Odisseia no espaço”, de Stanley Kubrick; e “Gravidade”, de Alfonso Cuarón. A junção dos três também almeja não estender o limite já condicionado de seu público. São ajustados, conectados, dosados e equilibrados para que caibam na caixa, inovando até certo ponto (realismo versus cotidiano) e voltando ao padrão já definido (utilizando-se de gatilhos comuns à construção da sinestesia – a edição independente à massa, o público médio).
Se buscarmos compreensão na citação latina “per aspera ad astra”, então encontraremos respostas-pistas em suas traduções livres: “por ásperos (caminhos) até aos astros”; “chegar à glória por caminhos difíceis”; e ou “alcançar o triunfo (a imortalidade) por feitos notáveis”. Sim, tudo isso nos é mostrado. A de transpor planetas para que se possa provar o valor e que somos bons em algo. Mas seria mais um filme sobre astronautas? Sim. Só isso? Não.
Outro referência narrativa de “Ad Astra – Rumo às Estrelas” chega à cinematografia de Terrence Malick, principalmente por seu “A Árvore da Vida”, explicitamente digamos, por causa de sua narração em voz off. Internalizada, angustiada, resignada, em luto e à espera da morte. Pois é, é um filme que lista visualmente outros filmes. Como a ação planetária com um que de “Mad Max” e ou com a versão modernizada de “O Vingador do Futuro”. E como já foi mencionado, “2001” e “Gravidade”. Com esses dois, o espectador pode literalmente gerar inúmeras teorias da conspiração.
Uma delas é a de que a personagem de Brad Pitt encontrará Sandra Bullock de “Gravidade” na praia no final de sua viagem. E que encontrará o filho de “A Árvore da Vida” no céu, gestado por “2001”, que, por sua vez, exporta macacos raivosos do início ao “Planeta dos Macacos” e depois são colocados para explodir no espaço. Ok, voltando a Terra…
“Ad Astra – Rumo às Estrelas” discorre termos técnicos para embasar o conhecimento de seu roteiro (e o “Projeto Lima”). Pois é, extremamente pretensioso. Até porque os diálogos soam artificiais. Atmosferas rarefeitas sem estabilização podem fazer desmaiar; anti-matérias; cadeias irreversíveis. O espectador deve estar se perguntando: cadê “Interestelar”, de Christopher Nola? Sim, está também.
Com sua câmera subjetiva e participativa a fim de mostrar a sobrecarga física e pessoal das plataformas externas do sistema solar. “Toda vida pode ser destruída”, diz-se. Mas nada disso afeta os americanos: um misto de MacGyver com “Highlander – O Guerreiro Imortal”, que uma só “andorinha” “sem medo” parte ao universo e além (desconhecido, sem ninguém e “longe do sol”) para contornar a crise a crise de magnitude sem procedentes. Já vimos esse filme? Sim. E quando a ameaça do pai vem à tona, quem nós pensamos? “Tron – O Legado” e ou “Guardiões da Galáxia 2”.
“Ad Astra – Rumo às Estrelas” ainda conserva os bons valores familiares e de “perfeição” do ser humano, como a “promessa de ser sempre sincero”. Contudo, não podemos deixar de destacar é sua precisa parte técnica. Certas cenas causam a sensação do enjoo (e não é uma experiência em terceira dimensão) para que talvez possam justificar as apelações de completar a missão. É um filme de fragmentos. Mentais. De escolhas sem volta com seus clichês de efeito e suas inserções de filmes musicais antigos. Não mesmo. “Ad Astra – Rumo às Estrelas” não é o monolito, mas conseguimos nos entreter com seus efeitos de recriação espetacular.